João Silva

Graduado em economia e relações internacionais pela Boston Univeristy. Mestre em relações internacionais na University of Chicago e mestre em finanças pela University of Miami.


João Victor da Silva Compartilhar
João Victor da Silva

O Paradoxo das Criptomoedas

Quanto maior for o uso de criptomoedas, maior serão os riscos de regulamentações sobre as moedas digitais

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Imagem ilustrativa. Foto: Michael Wuensch Via Pixabay / Banco de Imagens.
Imagem ilustrativa. Foto: Michael Wuensch Via Pixabay / Banco de Imagens.

A preservação do poder de compra da moeda é um dos maiores anseios sociais. Afinal, a inflação é um dos fenômenos econômicos mais perversos, visto que, indiretamente, a população vai ficando mais pobre. Nesse sentido, todas as sociedades sérias buscam estabelecer mecanismos que impossibilitem, ou pelo menos minimizem, o aumento generalizado de preços.

O economista Milton Friedman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 1976, certa vez disse que “a inflação é sempre e em toda parte um fenômeno monetário”. Basicamente, a inflação acontece quando o crescimento da oferta de dinheiro supera a taxa de crescimento da produção de uma economia. Não é por acaso que todas as políticas monetárias que obtiveram relativo sucesso em controlar a inflação, possuem mecanismos para controlar a expansão monetária. Políticas de meta de inflação, padrão-ouro, currency board, câmbio fixo, controle de agregados monetários, entre outras políticas têm implicitamente ou explicitamente o controle da expansão monetária como um dos objetivos para se conquistar a estabilidade de preços.

Naturalmente, em um mundo cada vez mais informatizado, surgem novas opções para indivíduos e empresas se salvaguardarem da inflação. As criptomoedas hoje são uma das principais alternativas no mundo monetário. Afinal de contas, as criptomoedas mais utilizadas, como o Bitcoin, contam com mecanismos de limitação de expansão de sua oferta, os quais não podem ser alterados pelos seus “emissores”.


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Entretanto, o que tanto Friedman e os defensores das criptomoedas não ponderaram é que o problema da inflação não é exclusivamente monetário. O historiador britânico, Niall Ferguson, explica muito bem que “a inflação é primordialmente um fenômeno político”. Afinal, o descontrole monetário não surge do nada. A emissão desenfreada é sempre fruto de decisões políticas. Através da expansão monetária o governo pode tanto estimular artificialmente a economia, quanto financiar seus déficits. Portanto, o poder de compra da moeda está sempre condicionado aos governos manterem uma política econômica responsável.

No caso das criptomoedas, o governo não pode controlar a oferta de moeda. Contudo, os governantes controlam o Estado, que em última instância possui o monopólio da violência e da jurisdição. São através desses poderes que os governos impõem as leis e regulamentações impostas pelas instituições de Estado. Assim sendo, quando agentes privados oferecem soluções que minam, até então, atividades executadas exclusivamente pelo Estado, como a emissão de moeda, os agentes públicos utilizarão todos os instrumentos necessários para impedir que inovações privadas que ameacem os privilégios do setor público tenham sucesso.

Nesse sentido, a maior utilização de criptomoedas como reserva de valor, meio de troca e unidade de medida, são movimentos que ameaçam os poderes do Estado. Afinal, se a moeda estatal perde espaço para moedas privadas, então, o governo perde a capacidade de se autofinanciar e manipular a atividade econômica. Ademais, os governos terão mais dificuldades de controlar as transações financeiras. Por exemplo, muitas empresas e cidadãos russos estão utilizando criptomoedas para realizar transações internacionais; assim, os russos conseguem superar parte das sanções impostas pelos Estados Unidos e outros países europeus. Nesse sentido, as criptomoedas também passam a afetar a efetividade das políticas internacionais e de segurança dos países.

Diversos países já aprovaram leis que banem a utilização de criptomoedas, ou regulamentações excessivas que tornam impraticáveis, ou financeiramente desvantajosas, a utilização de criptomoedas. O banco central chinês, por exemplo, tornou ilegais quaisquer transações com criptomoedas em 2021. Ou seja, apenas com o banimento chinês, 1,4 bilhão de pessoas já estão impedidas de entrar no mercado de criptomoedas. No entanto, as restrições de utilização de criptomoedas não se restringem a países autocráticos. Em março desse ano, o Presidente norte-americano, Joe Biden, assinou uma ordem executiva, demandando que diversos órgãos públicos americanos, realizem estudos e propostas, que incluem a regulamentação de criptomoedas.

Em um ambiente em que agentes públicos percebem o Estado como um fim em si mesmo, torna-se difícil acreditar que inovações que subvertam parte do poder do Estado não sejam regulamentadas ou até mesmo banidas. Diante deste cenário, o mercado de criptomoedas entra em uma situação paradoxal, pois quanto maior for o seu sucesso, maior será a percepção de ameaça aos governos. Quando os governos se sentirem ameaçados, a resposta será mais regulamentações contra esse setor.


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