João Silva

Graduado em economia e relações internacionais pela Boston Univeristy. Mestre em relações internacionais na University of Chicago e mestre em finanças pela University of Miami.


João Victor da Silva Compartilhar
João Victor da Silva

Ataques ao Banco Central: um subterfúgio para a inexistência de uma política fiscal crível

Responsabilizando a autoridade monetária, o governo atual tenta ocultar sua própria incapacidade em promover o crescimento econômico do país

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Foto: Marcello Casal Jr, Agência Brasil
Foto: Marcello Casal Jr, Agência Brasil

Durante meus anos de estudo, tive a oportunidade de assistir aulas com professores excepcionais, mas uma em particular deixou uma marca indelével em minha formação. A aula em questão tratava de Política Macroeconômica e era ministrada pelo economista Carlos Fernández Valdovinos, ex-presidente do Banco Central do Paraguai. Nas suas aulas, o Professor Valdovinos destacava a importância da coordenação entre a política fiscal e a política monetária, enfatizando que o Ministro da Fazenda poderia ser o melhor aliado ou o maior adversário do Presidente do Banco Central. A lição que aprendi foi clara: a política fiscal e a política monetária são indissociáveis e uma afeta diretamente a outra. Portanto, quando não há coordenação entre essas políticas, uma delas — geralmente a política monetária — precisa ser mais restritiva para evitar grandes desequilíbrios econômicos, como a depreciação cambial e o aumento das taxas de inflação.

Infelizmente, o Brasil ainda não atingiu o nível de sofisticação política necessário para discutir como podemos promover uma coordenação mais efetiva entre as políticas fiscal e monetária em benefício do desenvolvimento do país. Ao invés de implementar políticas públicas que reduzam os gastos públicos e estabilizem a trajetória da dívida, o governo está seguindo na direção contrária. As regras fiscais do país estão sendo dilapidadas, com o fim do Teto de Gastos, e políticas econômicas insustentáveis estão sendo estabelecidas. Um exemplo disso é o novo arcabouço fiscal — ou melhor, o “calabouço fiscal” — que estabelece um crescimento real do gasto público nos próximos anos. Isso significa que o país só poderá manter as contas públicas em equilíbrio por meio de uma taxa de crescimento econômico muito superior ao esperado para os próximos anos ou com um aumento agressivo da carga tributária.

O governo tem cometido erros não apenas no âmbito fiscal, mas também em outras áreas, como a falta de combate as invasões de propriedades rurais, a rotulação do agronegócio como “fascista”, a obstrução dos processos de privatização e concessão, o aumento de impostos, a utilização das empresas estatais para objetivos político-partidários, as propostas de revogações de itens importantes da reforma trabalhistas e outras medidas que prejudicam o ambiente de negócios. Tudo isso gera descrença nos investidores em relação à economia do país. Sem uma política fiscal crível, o risco de crédito do país aumenta e, sem um ambiente favorável aos negócios, o Brasil perde os investimentos necessários para crescer. Com isso, a economia começa a desacelerar, e o governo culpará o Banco Central para tentar disfarçar seus erros perante a população.

A alta dos juros no Brasil é reflexo da incerteza fiscal que paira sobre o país. A pandemia agravou a situação fiscal já delicada e, mesmo com o governo anterior entregando uma relação dívida-PIB inferior àquela recebida em 2019, o Governo Federal ainda gasta demais. É necessário modificar esse cenário, caso contrário, o Banco Central será obrigado a manter os juros altos por um longo período para evitar o aumento da inflação. Vale ressaltar que, atualmente, temos uma inflação menor do que a dos Estados Unidos justamente porque o país não cedeu às tentações populistas e o Banco Central do Brasil foi um dos primeiros do mundo a começar o ciclo de alta de juros.

Não é produtivo para o Presidente da República se referir ao Presidente do Banco Central como “aquele cidadão” e afirmar que ele está sabotando a economia brasileira para atender os interesses da oposição — essa acusação não faz sentido, especialmente porque o Banco Central aumentou significativamente as taxas de juros durante o ano eleitoral, prejudicando politicamente o governo anterior. Da mesma forma, não é aceitável que os apoiadores do governo pressionem o Banco Central realizando manifestações de ruas e incendiando fotos do Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

Atualmente, o governo pode reduzir os juros mediante uma política fiscal mais austera. Ao conter o gasto público, o governo pode reduzir a inflação e o risco-país por meio de dois canais que afetam a inflação: o da demanda e o das expectativas. Por um lado, a redução do gasto público reduz a demanda agregada da economia, o que tende a diminuir os preços. Por outro lado, com maior estabilidade macroeconômica, as expectativas de inflação caem. Dessa forma, o Banco Central pode reduzir os juros sem comprometer sua missão de estabilização de preços.

O governo atual foi eleito prometendo muito “amor” e “ciência”, mas é hora de transformar essas promessas em ações concretas e parar com os ataques infundados ao Banco Central. É preciso respeitar a ciência econômica e adotar uma política fiscal responsável, que assuma os equívocos do passado e busque soluções para o futuro. Em vez de ser o maior adversário do Banco Central, o governo deveria ser seu melhor aliado, trabalhando em conjunto para promover a estabilidade econômica e o bem-estar do povo brasileiro. A coordenação entre a política fiscal e a política monetária é fundamental para alcançar esses objetivos, e o Brasil só teria a ganhar com essa parceria.

As opiniões do colunista não refletem, necessariamente, a opinião do Portal SCC10.

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