João Silva

Graduado em economia e relações internacionais pela Boston Univeristy. Mestre em relações internacionais na University of Chicago e mestre em finanças pela University of Miami.


João Victor da Silva Compartilhar
João Victor da Silva

O Agronegócio e a Economia Política Internacional

Guerra na Ucrânia põe em risco a produtividade da agricultura brasileira

• Atualizado

Por

Foto: Pixabay
Foto: Pixabay

Em uma economia cada vez mais globalizada, a interdependência econômica entre os países é cada vez maior. Hoje, as cadeias globais de valor impedem que determinado país controle toda a cadeia da produção de determinado produto. Os insumos e serviços necessários para conseguir produzir-se de um simples lápis até um avião, dependem de empresas espalhadas ao redor do mundo. Em última instância, a atual conjuntura do sistema econômico global traz um grande dilema para os países. Por um lado, a expansão do comércio global permite o aumento de eficiência da produção, assim reduzindo os preços de bens e serviços. Por outro lado, as economias dos países ficam mais vulneráveis a crises externas que podem comprometer as cadeias logísticas e de produção global. 

De certa maneira, tanto a pandemia da Covid-19 quanto a guerra entre a Rússia e a Ucrânia expuseram como os países, inclusive as superpotências, tiveram sua segurança nacional fragilizada com a globalização do sistema produtivo. Em 2019, por exemplo, antes da pandemia começar, 72% das importações de máscaras e respiradores pelos Estados Unidos vinham da China – seu maior rival político e econômico. Drasticamente, quando a doença atingiu os Estados Unidos, o país se viu em uma temerária corrida em busca de suprimentos médicos ao redor do mundo, assim demonstrando a vulnerabilidade da segurança americana. 

Se as grandes potências têm sua segurança nacional fragilizada com a excessiva interdependência econômica do mundo globalizado, os países em desenvolvimento, em geral, sofrem efeitos potencializados das crises externas. No Brasil, o agronegócio, o setor que tem se firmado como a locomotiva de nosso crescimento, é um dos que mais estão suscetíveis a sofrer os efeitos negativos de choques externos.   

Atualmente, o principal Calcanhar de Aquiles do agronegócio brasileiro são os fertilizantes. Afinal de contas, para a produção agrícola moderna, o uso de fertilizantes é fundamental para garantir um elevado nível de produtividade das diversas culturas produzidas no país. Contudo, um fator que intensifica a dependência do agro brasileiro em fertilizantes é a baixa qualidade do solo do Cerrado, o qual é caracterizado pelos altos níveis de acidez e pobreza em minerais. Sendo a região do Cerrado a mais importante para produção de grãos do país, especialmente de soja (principal produto da pauta exportadora brasileira), ter garantia de acesso fácil aos fertilizantes é fundamental para estabilidade da agricultura.

Infelizmente, os recentes acontecimentos na Ucrânia e a restrição da exportação de fertilizantes pela China no ano passado colocam em risco o acesso brasileiro ao mercado de fertilizantes. Em 2021, por exemplo, 22% dos adubos importados pelo Brasil vieram da Rússia e 28% da Bielorrússia. Apesar de ambos os países não terem impedido a exportação desses insumos para o Brasil, as sanções econômicas impostas pelas potências ocidentais inviabilizam a negociação desses produtos com a Rússia e Bielorrússia. Atualmente, os meios de pagamento internacionais a estes países estão restritos e o transporte de carga desde esses países foram severamente afetados. 

Nesse sentido, o Brasil precisa recorrer a novos fornecedores de fertilizantes. Contudo, a queda brusca na oferta desses produtos irá elevar os preços desse produto. Consequentemente, o aumento dos custos de produção para o agronegócio crescerá, assim elevando os preços dos alimentos.

Certamente, o Brasil poderia ter essa crise amenizada caso políticas públicas voltadas a produção doméstica de fertilizantes, como o potássio e a ureia, tivessem sido implementadas no passado. Pelo contrário, a política e o judiciário brasileiro, inviabilizaram a extração desses minerais no Brasil. Como ilustração a esse ponto temos o caso das grandes reservas de potássio localizas na Foz do Rio Madeira, em Rondônia. Segundo a Ministra da Agricultura, Tereza Cristina, essas reservas poderiam suprir o agronegócio brasileiro por aproximadamente 200 anos. No entanto, a extração desses minerais está inviabilizada pela impossibilidade de realizar explorações em áreas demarcadas como terras indígenas.

Não é por acaso, que o presidente Bolsonaro precisa manter um discurso de neutralidade diante das agressões russas à Ucrânia. O Brasil não pode simplesmente inviabilizar o acesso aos dois mercados (Rússia e Bielorrússia) que são a origem de 50% dos fertilizantes utilizados em nosso país.

Diante desse cenário, em que a conjuntura política internacional coloca em risco a agricultura e a economia brasileira, é fundamental que a classe política se mobilize para propor soluções ao desafio imposto ao agronegócio do país. O Plano Nacional de Fertilizantes, que deve ser apresentado no fim do mês, irá propor algumas soluções para esse problema. Entretanto, será necessária uma cooperação entre os poderes para que o Brasil possa minimizar sua vulnerabilidade de acesso aos fertilizantes.

Em última instância, é preciso admitir que a expansão do comércio global trouxe avanços sem precedentes para as condições de vida de bilhões de pessoas ao redor do mundo. Apenas um sistema econômico baseado no mercado e a liberalização do comércio conseguem promover um ambiente de máxima eficiência econômica. Infelizmente, o bom funcionamento da economia depende de condições geopolíticas favoráveis. Em um mundo em que a hegemonia Ocidental é ameaçada por países como a China e a Rússia e por ideologias como o fundamentalismo islâmico, serão mais recorrentes crises políticas e conflitos militares. Assim sendo, é fundamental que os países elaborem estratégias para assegurar o acesso fácil a produtos fundamentais para a segurança de suas populações e a vitalidade de suas economias. O Brasil, um país em que o agronegócio é responsável por alimentar um bilhão de pessoas, tem a responsabilidade de manter a estabilidade de sua produção agrícola. Nesse sentido, torna-se urgente a proposição de soluções para minimizar a dependência brasileira em fertilizantes provenientes de países hostis ao Ocidente.

>> Siga o SCC10 no TwitterInstagram e Facebook.

Quer receber notícias no seu whatsapp?

EU QUERO

Ao entrar você esta ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

Fale Conosco
Receba NOTÍCIAS
Posso Ajudar? ×

    Este site é protegido por reCAPTCHA e Google
    Política de Privacidade e Termos de Serviço se aplicam.