Proposta de reforma tributária e seus impactos no desenvolvimento do país
Proposta de reforma tributária atual é limitada em relação à simplificação do sistema tributário
• Atualizado
A necessidade de reformar o sistema tributário parece ser um dos poucos consensos presentes na sociedade. O Brasil enfrenta uma das maiores cargas tributárias entre os países emergentes, um sistema de taxação regressiva e uma complexidade tributária que se encontra entre as maiores do mundo. Essa estrutura tributária impede investimentos na economia e atrasa o crescimento econômico do país.
Ao longo de décadas, o Congresso Nacional tem discutido a necessidade de alterações no sistema tributário. O Grupo de Trabalho da Reforma Tributária divulgou recentemente um relatório com propostas de alterações nas leis tributárias. Embora o relatório aponte avanços significativos em relação à simplificação do sistema de tributação, as melhorias ainda são insuficientes.
Além disso, a reforma proposta pelo Grupo de Trabalho pode resultar em um aumento da carga tributária, afetando especialmente o setor de serviços, e restringir a capacidade dos estados de implementar suas políticas econômicas.
Uma das principais melhorias apresentadas pelo Grupo de Trabalho da Reforma Tributária é a unificação de cinco impostos (ICMS, ISS, IPI e COFINS) em um único imposto, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). Essa mudança elimina a necessidade de substituição tributária, já que os impostos passarão a ser cobrados nos estados de destino dos produtos e serviços.
Além disso, a utilização ampla de créditos tributários será implementada, o que trará benefícios significativos para a indústria. Outro ponto positivo é a desoneração dos produtos e serviços exportados, que deixarão de ser tributados.
Contudo, a proposta de Reforma Tributária apresenta diversos problemas relevantes. O setor de serviços, que representa aproximadamente 70% do PIB e dos empregos no país, será severamente impactado pela reforma tributária. A Confederação Nacional do Comércio estima que a tributação sobre o setor de serviços deve aumentar em cerca de 84% com a nova proposta, o que resultará na inviabilidade de muitos negócios. Isso se deve ao fato de que as companhias do setor terão dificuldades para repassar integralmente os aumentos dos impostos ao consumidor, o que acarretará uma redução das margens de lucro e uma redução da capacidade de investimento.
Além disso, o setor de serviços não terá tantos benefícios tributários quanto a indústria, uma vez que a mão de obra é sua principal fonte de custos, o que não gera créditos tributários. Dado que o setor de serviços é a principal atividade econômica brasileira, o aumento significativo de impostos também acarretará um aumento significativo da carga tributária total.
A Reforma Tributária não apenas prejudica o setor de serviços, como também perpetua problemas distributivos originados do sistema vigente. Como exemplo, as empresas do SIMPLES Nacional e da Zona Franca de Manaus permanecerão aptas a receber benefícios fiscais. O SIMPLES Nacional continuará incentivando evasões fiscais e favorecendo empresas de baixa produtividade, ao restringir o processo de competição entre as empresas, o que resultará em uma redução da capacidade de crescimento da produtividade do país.
A Zona Franca de Manaus, por outro lado, continuará a dificultar o crescimento da indústria nacional, uma vez que os elevados custos de produção industrial na região amazônica, compensados por isenções fiscais, impedem o crescimento da indústria em regiões mais competitivas do país.
Um dos principais problemas da proposta de Reforma apresentada pelo Grupo de Trabalho é de natureza política. O Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) tende a centralizar o poder na União em detrimento dos estados e municípios. Aos estados só caberá estipular suas alíquotas de impostos, limitando sua capacidade de definir políticas tributárias específicas. Embora a “padronização tributária” possa parecer um avanço para o país em certa medida, os estados perderão autonomia na definição de suas políticas públicas. Se, considerando suas particularidades locais, os estados e municípios entenderem que estabelecer certos benefícios tributários será benéfico para seu desenvolvimento econômico, terão pouca margem de manobra para implementá-los, uma vez que as regulamentações tributárias serão federais. Os defensores da Reforma argumentam que isso porá fim à “Guerra Fiscal” entre os estados.
Contudo, a caracterização das disputas fiscais entre os entes federativos como um problema parece ser um mito. A competição regulatória e tributária entre os estados incentiva todos os governos a melhorarem seus ambientes de negócios para atrair mais empresas, investimentos e talentos para suas regiões. Ademais, as diferenças políticas entre os estados tornam cada um deles um laboratório para todo país analisar os efeitos de diferentes políticas públicas e decidir quais delas podem beneficiar as suas respetivas regiões. Em última análise, limitar a capacidade de execução de políticas tributárias por estados e municípios pode significar um retrocesso na agenda de melhoria do ambiente de negócios dessas regiões.
É importante salientar que o Grupo de Trabalho da Reforma Tributária não apresentou propostas claras para a transição do sistema tributário atual para o novo sistema tributário. No entanto, devido aos estados “consumidores” serem beneficiados pela reforma em relação aos estados “produtores”, a proposta estabelece um período de transição entre 40 e 50 anos para a implementação completa do novo sistema. Além disso, a proposta prevê a criação de um fundo de desenvolvimento regional para compensar o fim da chamada “guerra fiscal” e promover as regiões menos desenvolvidas do país.
Contudo, essa proposta pode causar mais problemas de alocação de recursos econômicos e piorar os incentivos políticos. Afinal de contas, estados com políticas econômicas mais eficientes podem ser obrigados a compensar estados com políticas econômicas deficientes, o que não estimularia os estados com políticas inadequadas a promoverem mudanças em suas políticas públicas.
O Grupo de Trabalho apresentou, por fim, propostas para alterações em determinados impostos sobre o patrimônio. Essas mudanças incluem a incidência de IPVA sobre embarcações marítimas e veículos aéreos, a implementação de alíquotas progressivas de ITCMD e IPTU, o que pode incentivar práticas de planejamento tributário para evitar cargas tributárias excessivas.
Além disso, uma proposta adicional refere-se à criação de um imposto seletivo, conhecido como “imposto do pecado”, visando diminuir o consumo de produtos considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. No entanto, trata-se de um imposto polêmico, ao conceder mais poder ao governo em interferir na vida da população.
A Reforma Tributária desempenha um papel fundamental na construção das bases do desenvolvimento brasileiro. Uma reforma eficaz deve melhorar o ambiente de negócios, incentivar investimentos e impulsionar o crescimento econômico. No entanto, é crucial que as alterações nas leis tributárias não sejam utilizadas simplesmente para fortalecer o poder do Estado e aumentar a carga tributária a fim de financiar uma burocracia ineficiente. Do contrário, seria mais adequado evitar a implementação de uma suposta Reforma Tributária que poderia prejudicar, ao invés de melhorar, a situação socioeconômica do país.
A proposta de Reforma Tributária em discussão apresenta avanços significativos na simplificação do sistema tributário. No entanto, ela concede uma maior autoridade à União em detrimento dos estados, aumenta a carga tributária e impacta negativamente o setor de serviços. Além disso, ela preserva inconsistências do sistema atual, como o SIMPLES Nacional e a Zona Franca de Manaus.
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