João Silva

Graduado em economia e relações internacionais pela Boston Univeristy. Mestre em relações internacionais na University of Chicago e mestre em finanças pela University of Miami.


João Victor da Silva Compartilhar
Negócios

Friend-Shoring: Nova Oportunidade para Reindustrialização do Brasil

Em meio às turbulências geopolíticas, os países ocidentais desenvolvidos buscam estreitar as relações comerciais com as nações amigas

• Atualizado

Por

Imagem ilustrativa | Foto: reprodução/Canva
Imagem ilustrativa | Foto: reprodução/Canva

Pouco antes de ser eleito presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, em um discurso para estudantes, em que ele alertava os perigos da crescente concorrência econômica, militar e política da União Soviética e da China contra os Estados Unidos, Kennedy fez uma excelente reflexão sobre momentos de crise. Nesse evento, o ex-presidente americano disse: “quando escrito em chinês a palavra crise compõe-se de dois caracteres: um representa perigo e o outro representa oportunidade”. Kennedy entendia o avanço do comunismo como uma ameaça séria ao mundo livre. Contudo, também estavam surgindo novas oportunidades para o desenvolvimento mundial. Kennedy acrescentou em seu discurso que os avanços científicos e tecnológicos representavam grandes oportunidades para o avanço da prosperidade para todo planeta.

As palavras de Kennedy, em última instância, deveriam servir de reflexão para países que vivem ambientes políticos e econômicos conturbados, assim como o Brasil vive hoje. É inegável que a pandemia e o conflito entre a Rússia e a Ucrânia trouxeram grandes desafios a economia brasileira. Problemas como inflação, endividamento e desemprego, por exemplo, vêm afetando a vida de muitos brasileiros nos últimos anos. De certa maneira, se o Brasil não avançar como uma agenda de reformas econômicas que tornem o país atrativo para investimentos e garanta a estabilidade macroeconômica, podemos nos aproximar da situação econômica calamitosa que alguns países estão experimentando hoje, como a Argentina.

Felizmente, assim, como mencionado por Kennedy, as crises não trazem apenas perigos, mas também oportunidades. Atualmente, a mudança de paradigma das políticas comerciais das potências ocidentais são umas das principais fontes de oportunidade para a aceleração do crescimento econômico do Brasil. Basicamente, em meio as turbulências geopolíticas da atualidade, as potências ocidentais desejam migrar parte do seu comércio de países como Rússia e China para países que possuem um maior alinhamento ideológico e estratégico com o Ocidente. Este é o chamado “friend-shoring”, ou seja, o comércio com nações amigas.

Recentemente, em visita à Coreia do Sul, a Secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, disse que os Estados Unidos precisam criar cadeias globais de valor e logísticas mais resilientes. Afinal, a dependência do comércio com rivais geopolíticos pode representar grandes ameaças a economia de seu próprio país. Assim sendo, Yellen defendeu a implementação de um novo paradigma das relações comerciais americanas: os Estados Unidos devem largar o atual paradigma de comercializar o máximo com países que possam oferecer produtos ao menor custo possível, independentemente dos riscos políticos, e se aproximar comercialmente de aliados e países amigáveis, mesmo que isso traga um pequeno aumento de custos para empresas e indivíduos americanos.

Diante de um cenário de realinhamento do comércio global, o Brasil tem as condições para passar por um processo de reindustrialização. Afinal de contas, o Brasil é um país que está geralmente alinhado com as políticas das potências ocidentais. No entanto, o simples fato do Brasil ser um país aliado dos Estados Unidos e conservar vários valores da cultura ocidental, não garantirá que os investimentos externos cheguem à indústria brasileira. A classe política e burocrática também precisará cumprir seu papel.

O Brasil possui fundamentalmente três problemas estruturais que afugentam indústrias do exterior a se instalarem no país e, portanto, precisam ser resolvidos. Em primeiro lugar, o sistema tributário caótico do país traz diversos problemas as empresas. A complexidade do sistema faz com que as empresas precisem dedicar muito recursos e tempo apenas para calcular os impostos devidos, que mesmo assim são muitas vezes alvos de judicializações que criam mais cursos as empresas. Outro problema é a elevada carga tributária sobre as empresas que onera demasiadamente o setor e desincentiva o crescimento das corporações.

O segundo problema que precisa ser atacado pela classe política é a infraestrutura precária do país. É verdade que muitos avanços foram feitos nos últimos anos, principalmente com o processo de privatizações e concessões de ativos de infraestrutura. Contudo, o Brasil carece de uma estrutura ferroviária e portuária adequada para baratear o custo de transporte. Além disso, a capacidade de transmissão de energia brasileira ficará sobrecarregada caso o setor industrial cresça muito. Nesse sentido, investimentos nos setores de transporte e energia serão fundamentais para o Brasil receber novas indústrias.

Por fim, o Brasil precisará de novas reformas na legislação trabalhista. Apesar dos avanços que reforma trabalhista aprovada durante o Governo Temer trouxe para o mercado de trabalho brasileiro, ainda há muito a ser feito. O mercado de trabalho precisa ser mais flexível. Contratações e demissões devem ser mais dinâmicas para garantir a competitividade das empresas. Além disso, é essencial desonerar as folhas de pagamento para baixar os custos trabalhistas das empresas e permitir o ingresso de mais profissionais no mercado formal de trabalho.

Caso a classe política brasileira tenha capacidade de melhorar os sistemas tributário e trabalhista, além de desenvolver a infraestrutura energética e de transportes do país, o Brasil terá condições de se tronar um novo polo industrial do mundo. Para isso é preciso largar o clichê de que “o Brasil é o país do futuro”. Na realidade, nas últimas décadas o Brasil vem se caracterizando como o país das oportunidades perdidas. Com a consolidação da política comercial “friend-shoring” das potências ocidentais, surge uma oportunidade de reindustrialização e desenvolvimento econômico para o Brasil. Caso deixemos essa oportunidade passar, correremos o perigo de continuar na armadilha de baixo crescimento que temos experimentado nas últimas décadas.

>>> PARA MAIS NOTÍCIAS, SIGA O SCC10 NO TWITTERINSTAGRAM E FACEBOOK.

Quer receber notícias no seu whatsapp?

EU QUERO

Ao entrar você esta ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

Fale Conosco
Receba NOTÍCIAS
Posso Ajudar? ×

    Este site é protegido por reCAPTCHA e Google
    Política de Privacidade e Termos de Serviço se aplicam.