João Silva

Graduado em economia e relações internacionais pela Boston Univeristy. Mestre em relações internacionais na University of Chicago e mestre em finanças pela University of Miami.


João Victor da Silva Compartilhar
Taxação

A culpa é deles, mamãe

Em vez de reconhecer as falhas de sua política econômica, o Ministro da Fazenda escolheu buscar culpados para os problemas econômicos do país

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Foto: Divulgação/Washington Costa/MF
Foto: Divulgação/Washington Costa/MF

A economia brasileira enfrenta uma crise de desconfiança. Devido ao descontrole fiscal, os títulos públicos estão sendo negociados a taxas de juros estratosféricas, chegando a 15% ao ano. O dólar se consolidou acima de R$ 6. A inflação, por sua vez, continua em ascensão, ultrapassando a meta estabelecida para 2024. Em um cenário econômico marcado por um rigoroso aperto monetário e pelo esgotamento dos estímulos fiscais, somado às incertezas globais provocadas pela eleição de Donald Trump, a economia brasileira já apresenta sinais de desaceleração.

Em meio a este cenário turbulento, seria de se esperar uma correção de rumo por parte do governo. No entanto, em vez de reconhecer as falhas da política econômica e promover uma redução de gastos públicos, além de reformas que melhorem o ambiente de negócios e a produtividade da economia, o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, optou pelo caminho da negação.

Em entrevista realizada pela CNN Brasil na última sexta-feira (17), a jornalista Thais Herédia fez uma pergunta pertinente ao Ministro, questionando a desconfiança tanto da população quanto dos agentes do mercado financeiro em relação às medidas econômicas do governo. Esperava-se que o Ministro oferecesse uma resposta fundamentada ao menos em princípios econômicos básicos. Contudo, Haddad teve a proeza de atribuir os problemas econômicos brasileiros ao ex-Presidente Jair Bolsonaro, ao Deputado Federal Nikolas Ferreira e, claro, ao inevitável Donald Trump.

Infelizmente, já se tornou um hábito para Haddad culpar terceiros. Quando o dólar ultrapassou a barreira dos R$ 6, ele apontou os “especuladores financeiros” como responsáveis. Quando confrontado sobre o déficit das contas públicas, Haddad prefere culpar seus antecessores, especialmente Paulo Guedes — no entanto, ele omite convenientemente o descalabro fiscal iniciado por Lula e sacramentado por Dilma.

Haddad se comporta como aquela típica criança que, ao ser flagrada fazendo algo errado, prefere culpar o amiguinho, o irmãozinho ou até mesmo um bichinho imaginário. O grande problema é que o adulto Haddad ocupa o cargo de Ministro da Fazenda de uma das dez maiores economias do mundo, e suas ações impactam diretamente a vida de mais de 200 milhões de brasileiros. Em termos políticos, a tática de culpar terceiros pode ser eficaz a curto prazo. No entanto, negar a realidade e fugir das responsabilidades não solucionará os desafios econômicos do país. Pelo contrário, a ausência de uma política econômica crível apenas agravará a deterioração das expectativas econômicas e intensificará os desequilíbrios atuais. Quando os preços no supermercado se tornarem proibitivos para a população, utilizar o já desgastado jargão de “fake news” não será suficiente, pois o discurso estará completamente descolado da realidade vivida pela sociedade.

Enquanto Haddad insiste em negar a realidade e em culpar terceiros pelos desafios econômicos do país, é crucial focarmos nos fatos. Em 31 de dezembro de 2022, o Brasil concluiu o ano com uma taxa de câmbio de R$ 5,28. Além disso, o país alcançou um superavit primário em 2022, de aproximadamente 0,6% do PIB. Apesar dos gastos extraordinários devido à pandemia, o governo Bolsonaro deixou para seu sucessor uma relação dívida/PIB de 72,9%, uma melhoria comparada aos 74,8% recebidos em 2018. A independência da política monetária possibilitou ao Banco Central adotar um rigoroso aperto monetário durante um ano eleitoral. Como resultado, o Brasil encerrou 2022 com uma inflação de 5,8%, inferior à de economias desenvolvidas como os Estados Unidos (6,4%), a Zona do Euro (9,2%) e o Reino Unido (9,2%). Além disso, no mandato do governo anterior, houve um aumento de 10% no número de empregados. Foram deixados investimentos em infraestrutura contratados no valor de mais de R$ 1 trilhão, mais de 15 acordos comerciais foram firmados, e o Brasil se tornou o governo mais digitalizado das Américas.

Hoje, a realidade é bastante distinta. O crescimento econômico está sendo impulsionado pelo setor público em detrimento do setor privado. As empresas estatais, que antes registravam lucro, agora enfrentam prejuízos recordes, com uma expectativa de déficit de R$ 7,2 bilhões em 2024. A relação dívida/PIB está projetada para encerrar o ano em torno de 80%, após dois anos consecutivos de déficit primário. A autonomia do Banco Central é ameaçada regularmente pelo governo, minando a credibilidade da instituição. O dólar se firmou acima de R$ 6,00, com o Brasil registrando uma das maiores desvalorizações frente ao dólar em 2024. Além disso, as expectativas de mercado para os juros futuros sugerem que a taxa Selic pode atingir quase 15% até o fim do ano.

Chegou o momento de nós, eleitores, agirmos como os pais dessa figura infantilizada no cargo de Ministro da Fazenda, que insiste em culpar terceiros, e corrigirmos os rumos errados que ele está tomando. É imperativo ensinar-lhe um conceito valioso, especialmente valorizado pelos americanos, mas que carece de uma tradução direta no português: o princípio conhecido como “accountability”. Este termo refere-se à obrigação de um indivíduo responder por suas ações, decisões e resultados. Afinal, todos somos chamados a prestar contas pelas nossas escolhas, e isso se aplica de maneira ainda mais rigorosa àqueles em cargos públicos, que dependem da confiança da sociedade. Somente ao assumir responsabilidades e enfrentar a realidade é que podemos avançar e corrigir os erros — e, infelizmente, há muitos erros na gestão da economia brasileira. Chega de culpar os outros dizendo “a culpa é deles, mamãe”. É hora de assumir os erros, corrigi-los ou ceder o cargo a alguém mais competente.

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