“Vamos Salvar o Dia”: Projeto criado após crime em Blumenau busca por justiça e melhoria nas leis
Objetivo do projeto é ressignificar a data, o momento e a perda para poder fazer algo memorável por outras pessoas
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Há um ano, quatro crianças foram mortas e outras cinco ficaram feridas em um crime cometido na creche CEI Cantinho Bom Pastor, no bairro Velha, em Blumenau. Regina Maia, mãe de Larissa, Jennifer e Paulo, pais de Bernardo, transformaram essa data em amor com a criação do projeto “Vamos Salvar o Dia”. A proposta busca por justiça, melhoria nas leis, na segurança nas escolas e ajuda às famílias.
Em 2023, um grupo de familiares foi até Brasília com o apoio de políticos catarinenses para formular e entregar um Projeto de Lei com propostas de mudanças e um abaixo-assinado com pedido de enrijecimento da legislação penal. Regina, que esteve na Capital brasileira e conversou com o SCC10, diz que há muitas reivindicações.
“A gente pede que crimes como esses contra crianças e escolas sejam considerados crimes hediondos, o que no Brasil ainda não é. A gente também pede segurança nas escolas: câmera de monitoramento, botão de pânico, uma série de itens necessários. E também acompanhamento para saúde mental, que as crianças têm que ter com psicólogos”.
Regina ainda reforça que o objetivo do projeto é ressignificar a data, o momento e a perda para poder fazer algo memorável por outras pessoas:
“A gente quer levar algo para vocês, para os filhos de vocês, para os netos de vocês, porque os nossos filhos não vão voltar. Então, tudo o que a gente está fazendo é pensando no bem-estar, no futuro. Por isso, o projeto também vai nas escolas fazer palestras e rodas de conversas, levando o tema de não terceirizar o amor. Que os pais precisam dar valor para os filhos, ter um tempo de qualidade, acompanhá-los na escola, nas tarefas, nas reuniões”.
Quatro estrelas brilhantes
Junto das crianças da creche Cantinho Bom Pastor, Bernardo Pabst da Cunha, de 4 anos, segue vivo como livro e como herói. O menino ganhou uma história de superação, amor e esperança no livro “Bernardo, uma estrela brilhante”, que será lançado neste sábado (6), às 13h30min, no Shopping Park Europeu, em Blumenau.
Em páginas ilustradas e alegres, o pequeno herói é homenageado pela autora e sua madrinha Júlia de Souza Machado. O intuito do livro é abraçar as famílias impactadas pelo crime e ajudar professores, pais e crianças que precisam enfrentar o luto.
“Essa história não se tornou apenas sobre crianças e suas famílias, mas sobre cada pai, mãe, parente, amigo, professor e professora”, explica Júlia.
Nesse mesmo sentido, Alconides Ferreira, diretora de creche, conversou com exclusividade com o SCC10. Ela afirma que o papel dela é continuar oferecendo um ensino de qualidade.
“Nós sempre buscamos novidades e incentivos para o aprendizado, o desenvolvimento pessoal e a socialização das nossas crianças. Após esse um ano, continuamos nos mantendo dentro dos nossos propósitos e investimos em jogos e brinquedos desafiadores. Realizamos muitas brincadeiras, novos projetos pedagógicos e rodas de conversas para transmitir e reforçar ainda mais os bons valores que queremos que eles aprendam. Não camuflamos o que aconteceu, mas ensinamos aos alunos que os problemas devem ser superados e assim a cada dia que passa vamos transformando a dor que sentimos, em amor”.
O processo
Os advogados Luís Felipe Obregon e Vanieli Fachini, que representam a grande maioria das famílias das vítimas, são pais de alunos da creche. Eles ressaltam que a comunidade escolar do Cantinho sempre foi muito unida e que o local é considerado um ótimo lugar de ensino, tanto que seus filhos escolheram voltar para a creche.
Quanto ao processo, Obregon explica que no fim do mês de outubro de 2023, a 2ª Vara Criminal de Blumenau determinou que o suspeito fosse levado a júri popular. Ele foi denunciado por quatro homicídios qualificados e cinco tentativas de homicídios qualificados. Todas com qualificadoras de motivo torpe, meio cruel, uso de recurso que dificultou a defesa das vítimas e crime contra menores de 14 anos.
Segundo o advogado, a Defensoria Pública, que representa o suspeito, não se opôs à escolha do julgamento, mas sim, ao local onde ele irá acontecer. A defesa alegou que como o fato ocorreu em Blumenau, talvez não haja imparcialidade na decisão dos jurados. Agora os representantes das famílias aguardam pelo parecer do recurso para o agendamento da data do júri, que deve ocorrer nos próximos meses. O Ministério Público de Santa Catarina foi contatado mas não havia retornado até a publicação deste conteúdo.
Ações de enfrentamento à violência nas escolas
A creche passou por uma grande reforma para voltar a receber as crianças. Conforme os advogados das famílias e da diretora, como a creche é particular, foram os próprios pais que arrecadaram o dinheiro para as mudanças estruturais, especialmente na área do parquinho, onde tudo aconteceu.
Eles afirmam que, em um ambiente onde o foco seria a educação, muros foram erguidos e seguranças foram contratados. Como pais, os advogados relatam que viram mudanças acontecer tanto no Cantinho, quanto em outras escolas da região.
A prefeitura de Blumenau afirma ao Portal SCC10 que, logo após o crime, assumiu compromissos imediatos com as escolas municipais. O prefeito Mário Hildebrandt frisa que, ao todo, foram seis demandas listadas a curto e a longo prazo, que seguem em andamento até 2024.
Primeira: plano de muramento e cercamento. “Fizemos uma revisão da segurança das escolas, com um protocolo que pode ser revisado. Discutimos isso com a comunidade, inclusive, e decidimos pela cerca para que a própria polícia possa ver o que está acontecendo quando passa pelas escolas”.
Segunda: um plano de contingência para cada unidade escolar, que está em processo de licitação e implantação. O plano tem participação de autoridades como Polícia Civil, Polícia Militar, Defesa Civil e Polícia Científica.
Terceira: instauração de vigilância armada em todas as escolas municipais.
Quarta: contratação de equipes profissionais, como psicólogos e assistentes sociais, para prestar apoio aos professores na detecção e acolhimento de crianças que sofrem com violência, têm comportamento violento ou sofrem bullying. Hoje, são sete equipes que atuam conforme cada região da cidade.
Quinto: implementação de botões de pânico e câmeras de segurança, que está em processo de licitação.
Sexta: conjunto de ações menores para o aprimoramento de segurança nas escolas. Entre elas, está a capacitação de professores de como reagir em situações de atentado, seguindo o protocolo FEL (Fugir, Esconder e Lutar) e alinhando ao plano de contingência.
Para as escolas privadas de Blumenau, há a possibilidade de regulamentação e participação nos planos de contingência.
Protocolo FEL
Sobre o protocolo FEL, o comandante do 10º Batalhão de Polícia Militar de Blumenau, Márcio Alberto Filippi, em entrevista ao SCC10, relatou que aproximadamente 7 mil pessoas, diretamente ligadas aos educandários, já passaram pela capacitação. Além disso, ele relatou que a PMSC já realizou cerca de 8 mil visitas preventivas nas unidades de ensino de Blumenau.
O comandante destaca que algumas medidas as próprias escolas já estão tomando, como a construção de muros mais altos e seguranças privados. “Acredito que a segurança é um conjunto de coisas, que somadas, podem proporcionar tranquilidade às pessoas que deixam os seus filhos nos ambientes escolares”, ressaltou.
No âmbito estadual, a PMSC também atua nas escolas através da Rede de Segurança Escolar, que ocorre de forma permanente. Até o momento, 4.286 escolas, públicas e privadas, em 295 municípios, recebem o policiamento de forma programada dentro e fora do ambiente escolar. Dados do treinamento do protocolo FEL, em Santa Catarina, mostram que mais de 63 mil professores, 53 mil alunos e quase 5 mil policiais receberam a capacitação até o momento.
Já a Polícia Civil possui o protocolo Presente, criado pela instituição após estudos realizados por policiais civis nos EUA e em Israel, a pedido do Governo do Estado. Além disso, a PCSC também é responsável pela investigação e prevenção de possíveis casos que envolvam a segurança escolar. A Polícia Civil conta ainda com o Ciberlab para investigações complexas.
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