“O Talibã domina pelo medo”, afirma catarinense que serviu pelos EUA na guerra do Afeganistão
Morador dos Estados Unidos desde 2002, Alexandre Danielli se tornou Fuzileiro Naval em 2008 e foi enviado para a guerra junto às forças militares norte-americanas
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As cenas registradas no Afeganistão desde o último fim de semana têm surpreendido pessoas ao redor do mundo. Neste domingo (15), o grupo fundamentalista islâmico Talibã voltou ao poder do país asiático, dominou a capital Cabul e causou a fuga de civis daquele território.
Imagens que circulam em veículos de imprensa e nas redes sociais mostram a intensa movimentação que ocorreu nesta segunda-feira (16), no aeroporto internacional de Cabul. Pessoas invadiram a pista e tentaram entrar nos aviões; em alguns vídeos é possível ver que afegãos se penduravam em aeronaves na tentativa de deixar o local.
Entre os anos de 2010 e 2011, o catarinense Alexandre Danielli conheceu bem de perto os desafios enfrentados pela população afegã diante do Talibã – grupo que segue as diretrizes radicais da Sharia, o conjunto de leis islâmicas. Morador dos Estados Unidos desde 2002, Alexandre, que nasceu em Joaçaba, se tornou Fuzileiro Naval em 2008 e foi enviado para a guerra junto às forças militares norte-americanas e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Os militares estiveram no Afeganistão durante os últimos 20 anos.
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Segundo Alexandre, o território afegão é um local estratégico para o terrorismo. “O Afeganistão era o terreno dos terroristas. Eles treinavam lá, vendiam drogas e com a ocupação, acabamos com tudo isto”, conta.
No regime imposto pelo Talibã a população é submetida a uma série de restrições religiosas, culturais e sociais. Alexandre relata que, durante os meses em que esteve no Afeganistão, entendeu a forma de domínio do grupo fundamentalista.
“O Talibã domina pelo medo, tortura, vingança e ameaças. As mulheres têm menos valor do que um animal para eles.”
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De acordo com o veterano de guerra, o medo é o grande causador do desespero dos afegãos e o grande motivador para que as pessoas queiram sair da região.
“As pessoas estão fugindo do país pelo medo. A tortura é uma assinatura muito forte do Talibã e quem aceitou ajuda ou ajudou a OTAN irá sofrer”, explica.
Conflito complexo no Afeganistão
Além do Afeganistão, Alexandre esteve em missões no Iraque, Irã, Paquistão, Quirguistão e Yemen. Entre os anos de 2010 e 2011, os mais violentos do conflito, o Fuzileiro conta que perdeu vários companheiros em combates contra os grupos fundamentalistas.
“Fiquei oito meses na guerra do Afeganistão; 2010 e 2011 foram os anos mais violentos. Houve muito combate e perdi muitos colegas”.
Questionado sobre possíveis soluções para a região, Alexandre afirma que esse é um problema que está longe de ser resolvido. Ele conta que a população do país sustenta conflitos de séculos e rixas entre famílias, o que colabora com o clima de hostilidade entre os grupos.
“Quando a gente recrutava algum jovem para virar soldado afegão, a família rival deles mandava o filho para virar Talibã. Eles não admitiam as famílias estarem no mesmo grupo”, explica.
“A OTAN ou a ONU deveriam manter tropas por lá definitivamente. A caça ao Talibã, Al Qaeda e ISIS deveria ser constante”, finaliza.
Destino: Estados Unidos
“Eu vim com cem dólares no bolso”. Alexandre relata que, após decidir sair do Oeste catarinense, chegou aos Estados Unidos com poucos recursos, aos 18 anos de idade. “Eu fiz faculdade aqui e nunca pensei em virar militar. Eu casei com uma americana, tivemos um filho e nesse período eu consegui o Green Card“, que é o documento necessário para viver legalmente no país.
Quando decidiu se alistar nas Forças Armadas dos EUA, Alexandre conta que era necessário ter o Green Card e o inglês fluente; etapas que ele já havia cumprido. Após esse processo, o ex-fuzileiro naval – que é cidadão americano desde 2008 – passou por vários testes físicos, médicos e de conhecimentos específicos. Além dos testes, a família do catarinense também foi investigada para que ele se alistasse.
“Você não pode ter ligação de parentesco com ninguém que foi para a cadeia em qualquer país do mundo”, explica.
Em abril de 2019, Alexandre Danielli foi entrevistado por Danilo Gentili, no programa The Noite. Confira:
Alerta internacional
Nesta segunda-feira (16), Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, se pronunciou e afirmou que as autoridades do Afeganistão não quiseram reagir contra o grupo extremista. Biden disse que não se arrepende de ter tirado os militares norte-americanos do Afeganistão e que civis americanos terão auxilio para sair da região.
“Autorizei 6.000 soldados dos EUA a se deslocarem para o Afeganistão para ajudar na partida do pessoal civil dos EUA e Aliados do Afeganistão – e para evacuar nossos aliados afegãos e afegãos vulneráveis para a segurança fora do país.”
No último domingo, Malala Yousafzai, ativista, defensora da educação de meninas e vencedora do Prêmio Nobel da Paz, se pronununciou por meio das redes sociais e demonstrou grande preocupação com o retorno do Talibã ao Afeganistão.
“Assistimos em completo choque enquanto o Taleban assume o controle do Afeganistão. Estou profundamente preocupado com as mulheres, as minorias e os defensores dos direitos humanos. As potências globais, regionais e locais devem exigir um cessar-fogo imediato, fornecer ajuda humanitária urgente e proteger refugiados e civis”, afirmou.
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