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Negligência

Castigo no canil: diretora de creche é denunciada pelo MPSC por maus-tratos e lesões corporais

Segundo Inquérito Policial, as crianças dormiam no chão e ficavam trancadas atrás de grades em uma espécie de "casinha do castigo"

• Atualizado

Redação

Por Redação

Foto: Arquivo Pessoal | Cedido
Foto: Arquivo Pessoal | Cedido

A diretora responsável pela creche em São José fechada após a revelação de que as crianças atendidas pelo estabelecimento estariam sendo mal alimentadas, submetidas a castigos físicos e psicológicos e negligenciadas foi denunciada pela 9ª Promotoria de Justiça da Comarca pelos crimes de maus-tratos – com o agravante de que as vítimas, incluindo bebês, são menores de 14 anos de idade – e lesões corporais. A denúncia foi ajuizada nesta segunda-feira (13) e, se for aceita pela Justiça, a professora passará à condição de ré na ação penal pública.

Conforme consta na ação, o inquérito policial que apurou o caso constatou que a creche “funcionava de maneira irregular, pois não possuía registro de credenciamento e autorização perante a Prefeitura”, desde 2018 até o seu fechamento, em janeiro deste ano. Na época, imagens de bebês e crianças com ferimentos, dormindo em condições indignas e insalubres e, até mesmo, trancadas atrás de grades em uma espécie de “casinha do castigo”, foram expostas nas redes sociais, provocando a revolta dos pais e da comunidade. O estabelecimento acabou depredado por populares.

As investigações confirmaram que os maus tratos e agressões teriam ocorrido entre os meses de novembro de 2022 e janeiro de 2023, pelo menos. Foram coletadas provas e evidências, ouvidos os testemunhos de pais e mães e realizados exames médicos periciais nas vítimas, que confirmaram as lesões. 

“Nesta fase, foram identificadas pelo menos sete crianças, mas o número pode ser maior e outras vítimas de maus-tratos e lesões corporais poderão ser localizadas durante a fase de instrução processual, com o acolhimento da denúncia pela Justiça”, informou o MPSC. 

Pais não tinham acesso às salas

Consta na denúncia, que a diretora impedia aos pais e responsáveis pelas crianças o acesso às dependências da creche, o que os impossibilitava de conhecer a forma como seus filhos eram tratados. Com isso, eles confiavam que os pequenos eram atendidos de acordo com os serviços contratados: alimentação adequada, supervisionada por uma nutricionista, durante a permanência no estabelecimento – integral ou meio período; atividades educativas e de lazer; e cuidados com a higiene pessoal das crianças.

A realidade, porém, era outra, de acordo com o inquérito policial: uma única marmita, comprada de terceiros, era dividida entre todas as crianças; não havia pratos e talheres para todas e, assim, muitas “comiam com as mãos”; a creche entregava os pequenos sem banho; a sala de TV e de “soneca” não contava com berços e camas suficientes, nem mesmo lençóis e travesseiros, o que levava muitos a dormirem diretamente no chão “amontoados”. No local, ainda, havia uma “casinha de grades” que teria chegado a ser utilizada para castigo.

Diretora pode responder por maus-tratos

Diante dos fatos apurados, a 9ª PJ da Comarca de São José denunciou a diretora pelos seguintes crimes: maus-tratos, previsto no artigo 136 do Código Penal – “expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis (…) abusando de meios de correção ou disciplina” -, com o agravante de que o crime foi cometido contra vítimas menores de 14 anos de idade; e lesões corporais – artigo 129.

O Ministério Público se manifestou contra a decretação de prisão preventiva pedida pela autoridade policial e pelos advogados das famílias por entender que esta seria uma medida excepcional e que a acusada já não pode mais interferir nas investigações e nem representa ameaças às vítimas ou à ordem pública, especialmente porque as atividades da creche foram encerradas.

Por outro lado, o Ministério Público descartou a possibilidade de oferecer uma proposta de acordo de não persecução penal (ANPP) ou de transação penal devido “notadamente pelas circunstâncias e motivos do crime, bem como pela pluralidade de vítimas, todas crianças, o que demonstra ser a medida despenalizadora insuficiente para a prevenção e reparação da prática criminal”.

Entenda o caso

Denúncias de maus-tratos em uma creche particular no bairro Serraria, em São José, ganharam repercussão nesta semana, após uma ex-funcionária da unidade registrar um boletim de ocorrência relatando que crianças passavam fome e eram trancadas em um canil como punição por mau comportamento.

A ex-funcionária, que trabalhou por três dias no local, narrou que os alunos eram privados de comida, precisando dividir cinco bananas e uma maçã picada entre 17 crianças. A professora expôs ainda que uma marmita teria sido dividida entre quatro turmas, de cerca de 15 alunos cada.

Em entrevista ao SCC SBT, a dona e diretora da creche Ana Paula da Silva Medeiros nega as acusações, diz ser vítima de calúnia e afirma ainda que sempre defendeu os direitos das crianças. “Isso foi uma calúnia. Com 43 anos, sendo 24 de profissão, eu trabalhei em creche com nome, com câmeras, colégios públicos. Quem conhece meu trabalho sabe que eu jamais faria isso com a educação. Ao contrário, eu sempre lutei pelo direito das crianças e sempre fui além de ser uma professora. Não é só dar aula, é ir lá e colocar a mão na massa. Muitos professores que trabalham comigo estão me apoiando”, afirma.

Ana Paula destaca que o valor da mensalidade cobrada é baixo, mas que as alimentações são fornecidas com o auxílio de pais e responsáveis, que doam pães, frutas, vegetais e doces: “fome as crianças não iriam passar, é mentira, temos fotos das crianças comendo, piquenique embaixo da árvore”. A declaração da diretora também vai contra os detalhes fornecidos pela denunciante, que informou à polícia que a comida não era suficiente e que crianças não comiam por falta de alimento.

Canil X Casinha

Segundo a denúncia apresentada pela ex-funcionária, um canil era utilizado pela diretora e pelas professoras como local de castigo. Uma mãe de aluno afirma que o filho já havia contado ter ficado de castigo no “canil”. “Ele não sabe explicar. Quando aluguei uma casa ali, para você ver, já acontecia a tempo, porque quando aluguei a casa tinha uma grade que a gente abre e um lugar para sentar, e ele disse: “mamãe, castigo da escolinha”. Ele se sentou bem quietinho de cabeça baixa e é exatamente como ele ficava lá no canil”, disse.

A utilização do “canil do castigo” é negada por Ana Paula. “Nós usamos o espaço como casinha, pintamos de verde e de amarelo. O espaço jamais ficou fechado, as crianças tinham acesso para brincar e elas entravam e saíam. Muitas vezes brincamos com eles lá dentro”, conta a diretora, que explica que a estrutura já existia antes do local ser alugado, e que devido ao contrato ela não poderia desmanchar, por isso decidiu adaptar para um ambiente de brincadeiras.

Agressões:

Em entrevistas ao SCC SBT, uma mãe de um aluno, que não quis ser identificada, relatou que o filho sofria maus-tratos e que uma professora já teria utilizado um cabo de vassoura para agredir a criança, além de ter o deixado preso em uma grade. “O primeiro dia que meu filho foi para a creche, quando a gente foi buscá-lo, quando chegamos na porta da escola, ele simplesmente começou a chorar desesperadamente, falando que a professora tinha batido nele. Simplesmente fiquei em choque e, ao mesmo tempo, querendo acreditar no meu filho e querendo não acreditar”, disse uma das mães.

Sobre os machucados, Ana Paula aponta serem provocados em brincadeiras entre as próprias crianças e ocorriam devido ao tamanho das unhas: “acontecia das crianças estarem com a unha grande, elas se arranham. Eu avisava as mães quando as crianças se arranhavam e que as unhas estavam grandes”.

Encaminhada para a delegacia

No dia que a denúncia se tornou pública, a proprietária da creche chegou a ser encaminhada para a Delegacia de Polícia Civil e prestou depoimento, sendo liberada em seguida. Segundo a Polícia Civil, o delegado considerou não ter elementos suficientes para a prisão.

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