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Rara e crônica

“É terrível”: Rara, Psoríase Pustulosa Generalizada pode aparecer em qualquer momento da vida 

Nove em cada um milhão de brasileiros possuem PPG, que se não tratada pode levar a morte

• Atualizado

Vitória Hasckel

Por Vitória Hasckel

Pequenas bolhas de pus, pele vermelha, dores intensas, ardência e coceira são sintomas da Psoríase Pustulosa Generalizada (PPG), uma doença autoimune, rara, sem cura, e não contagiosa que acomete nove em cada um milhão de brasileiros. Marcada por crises, que podem ir e vir ao longo da vida, a PPG pode aparecer de forma isolada ou acompanhada de outro tipo de psoríase e é um dos tipos da doença mais agressiva, podendo levar a morte, se não tratada. 

Desde os três anos de idade a psoríase faz parte da vida da psicóloga baiana Neuza Pereira, de 66 anos. “Eu fiquei anos sem diagnóstico e também com diagnósticos falsos”, relembra Neuza, que por volta dos 30 anos descobriu sofrer de psoríase pustulosa generalizada e lidou com a doença durante a gravidez das duas filhos.

O diagnóstico da PPG, assim como as demais psoríases, é clínico e laboratorial, com exames, incluindo hemograma e uma biópsia de pele. Após anos sem saber o que tinha e apesar da dor, Neuza recebeu o diagnóstico com alívio: “Foi a coisa mais linda da minha vida”, conta Neuza ao relembrar o atendimento dado pela dermatologista que diagnosticou a PPG.  

“Queima, cria bolhas, que inflamam e estouram. É uma doença que nos causa muito mal, porque traz febre, dor, inchaço, destrói a autoestima e afeta o nosso psicológico”, conta Neuza.

Ela está com a PPG controlada, mas convive diariamente com sintomas de outros tipos de psoríase, como a palmo-plantar, que é quando as lesões aparecem como fissuras nas palmas das mãos e solas dos pés, a gutata, caracterizada pelo aparecimento de pequenas lesões em forma de gotas pelo corpo, e a artrite psoriásica, que é um tipo de artrite crônica que atinge as articulações de pessoas diagnosticadas com psoríase. 

Conheça os outros tipo de psoríase:

De acordo com a Sociedade Brasileira de Dermatologia, a psoríase é “uma doença da pele relativamente comum, crônica e não contagiosa. É cíclica, ou seja, apresenta sintomas que desaparecem e reaparecem periodicamente.  É uma doença autoinflamatória da pele, na qual por predisposição genética, junto com fatores ambientais ou de comportamento, causam o aparecimento de lesões avermelhadas e que descamam na pele”.

A PPG:

O aparecimento da psoríase pustulosa generalizada pode acontecer em qualquer momento da vida e está associada com alguns gatilhos, como a utilização ou retirada de medicamentos, especialmente corticoides, infecções por vírus e estresse.

“É muito comum que a psoríase pustulosa generalizada seja desencadeada em pacientes que já têm psoríase vulgar, mas ela pode ser desencadeada em pacientes que não têm. A PPG pode se apresentar de uma forma aguda como uma doença potencialmente grave, que em casos raros e não tratados leva a óbito”, explica o dermatologista catarinense Athos Martini. Vale lembrar, que a psoríase está associada ainda a hereditariedade. O pai de Neuza nunca foi diagnosticado com a doença, mas a baiana lembra de o pai possuir as mesmas lesões de pele que ela teve ao longo da vida.

Em crises agudas de PPG, a pessoa pode apresentar febre, dor de cabeça, pode ter mal-estar associado a isso e dor no local das lesões. “Mesmo sendo uma doença crônica difícil de tratar, com os cuidados médicos necessário conseguimos fazer uma remissão”, explica Athos. 

A reumatologista Kathleen Daniotti acrescenta que a PPG não é algo que afeta apenas a estética: “O paciente precisa entender a complexidade da doença. A psoríase, de todos os tipos, não é uma doença apenas estética, não tratá-la aumenta risco de ter doenças cardiovasculares, como derrame, infarto”.

O reumatologista, médico que diagnostica e trata doenças que afetam o sistema muscoloesquelético e o tecido conjuntivo, também pode auxiliar no diagnóstico da psoríase, uma vez que a doença pode acometer múltiplos sistemas.

Tratamento:

Daniotti e Martini explicam que com o tratamento adequado existe a possibilidade do paciente com PPG, assim como as outras psoríases, viverem sem lesões de pele. O tratamento inclui medicações orais e injetáveis, conhecidas como medicamentos imunobiológicos, com disponibilização pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Em março de 2023, conforme noticiado pela Veja, a Anvisa aprovou o medicamento Spevigo (Espesolimabe), da farmacêutica Boehringer Ingelheim, indicado para o tratamento de psoríase pustulosa generalizada (PPG) em pacientes adultos. O novo medicamento, aprovado em 2022 pela Food and Drug Administration dos Estados Unidos, age na interleucina 36 (IL-36), apontada como principal responsável por causar a doença. “É um imunobiológico novo, desenvolvido especificamente para tratar a PPG. E é muito interessante, porque antes não tínhamos um medicamento específico para a doença”, destaca Athos Martini.

“A PPG é uma doença que tem tratamento, e tratamento extremamente eficaz, temos medicações que vão agir reduzindo as inflamações. É possível o paciente viver sem crises de psoríase e sem dor articular, desde que ele se comprometa com o tratamento”, destaca a reumatologista.

“Não há cura, mas é possível a remissão e controle da doença, e para isso é preciso seguir o tratamento, com boa alimentação, exercício físico e controle do estresse”. complementa Daniotti.

Para auxiliar no tratamento da doença, médicos destacam a necessidade de conciliar a utilização dos medicamentos adequados com bons hábitos, como boa alimentação substituindo alimentos industrializados, condimentados artificiais, refrigerantes, frituras, por uma dieta balanceada com frutas e verduras, assim como adicionar a prática de exercício físico.

“O tratamento inclui a prática de exercício físico, uma vez que o exercício ajuda a reduzir a inflamação tanto da pele quanto da articulação, no caso de pacientes com artrite psorisiaca, além de ele auxiliar o controle de estresse, que é um gatilho”.

Doenças

Além dos riscos de doenças cardiovasculares e dos sintomas físicos, a psoríase pustulosa Generalizada vêm acompanhada da vergonha e do desconforto com o julgamento e dos olhares alheios e impacta diretamente a autoestima dos pacientes, uma vez que as feridas, também conhecidas como pústulas, são visíveis aos olhos de todos. E, ao mesmo tempo que a psoríase afeta a parte psicológica, o psicológico pode agravar as crises de psoríase.

“A PPG tem uma estética muito feia, é terrível, é a mais feia das psoríases. O ferimento não tem um odor bom e afeta a nossa autoestima, nossa convivência com as pessoas, com a sociedade, nossa relação com as pessoas e a parte emocional afeta diretamente a doença”, diz Neuza, que relembra que ao longo de sua adolescência não usava roupas que mostravam as lesões na pele e evitava andar em determinados lugares para não receber olhares e comentários maldosos.

PPG não é contagiosa

De acordo com a Associação Brasileira de Psoríase, Artrite Psoriásica e de outras Doenças Crônicas de Pele (Psoríase Brasil), 11,6% dos pacientes com PPG apresentam ansiedade e 10,7% possuem depressão, uma vez que mesmo sem ser contagiosa, leva pacientes ao isolamento social. Em 2020, a pesquisa “Psoríase: conhecimento entre a população brasileira”, realizada pelo Instituto Datafolha a pedidoda farmacêutica AbbVie, constatou que 49% da população acreditava que a psoríase é uma doença contagiosa.

“O isolamento social em função da psoríase pode causar quadros de depressão graves, porque a pessoa começa a se entristecer, a não encontrar mais sentido no seu dia a dia, o que pode gerar quadros depressivos, ansiosos e de desesperança. O paciente acaba vivendo uma situação em que está privada do contato social, que é o que nos faz vivos”, explica Hericka Zogbi, psicóloga e doutora em Psicologia Clínica, que desde 2007, quando publicou a tese de doutorado “Pele e psiquismo, psicossomática e relações objetais: características relacionais de pacientes portadores de dermatoses”, atua mais próximo de pacientes com psoríase. 

Para evitar ou tratar a ansiedade e a depressão, que podem acompanhar a PPG, a psicóloga, assim como o dermatologista Athos Martini e a reumatologista Kathleen Daniotti destacam que é muito importante que os pacientes tenham amparo psicológico para lidar com tudo que o diagnóstico e o tratamento envolvem. “É muito difícil para o paciente lidar com tudo o que vem junto com a doença, como a dificuldade de ser diagnosticado, o tratamento, o custo significativo, as opiniões e dicas das pessoas. E para lidar com tudo isso, ter um espaço para o paciente falar é fundamental”, diz Hericka Zogbi, que abriu grupos de atendimento de pacientes online durante a pandemia e em 2022 contou com mais de 100 inscrições. 

“Os grupos são sempre muito mais efetivos, porque as pessoas pegam os contatos, elas trocam ideias, informação. O fato dos pacientes saberem que existem outras pessoas com a mesma condição, e poderem fazer esse tricô uns com os outros sempre ajuda muito”, pontua a especialista.

Informação é a chave 

Seja nas sessões de terapia, ou no olho a olho em conversas com vizinhos, amigos e desconhecidos, ou por meio de fóruns de discussões online e nas redes sociais, dialogar sobre a PPG vêm ajudando Neuza, assim como outros pacientes e até quem ainda não recebeu diagnóstico.

“Eu tenho a psoríase mas ela não me tem”

Neuza pereira

“A PPG existe e é preciso aceitar que temos ela e fazer o tratamento. Eu já usei muito a frase: ‘Eu tenho a psoríase mas ela não me tem’, mas tem hora que eu pergunto ‘será que não me tem, mesmo?”, brinca Neuza. “Eu brinco, mas a doença não vai me deixar desistir de nada”, afirma Neuza, que ao longo dos anos percebeu a importância de dialogar com outras pessoas: “Faz a diferença para mim, porque nós trocamos experiências e nos tranquilizamos também. Eu tento passar positividade sobre o tratamento”, conta Neuza.

Neuza segurando o bisneto ao lado das filhas e netas. Foto: Arquivo Pessoal

Fundada em 2005 e com sede em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, a Psoríase Brasil possui membros em todos os estados brasileiros e tem como objetivo informar as pessoas e buscar por mais direitos para pacientes com psoríase e outras doenças crônicas de pele. Nas redes sociais da associação, pacientes vem encontrando espaço para contar suas histórias e buscar mais informações sobre a doença. 

“Os pacientes precisam se informar sobre a doença, sobre onde procurar tratamento, é preciso que saibam que existe tratamento e que os pacientes podem ter qualidade de vida se segui-lo. As pessoas acham que a doença de pele é simples, mas não é. É grave, tem que ser tratado logo. Sem o tratamento adequado as pessoas podem perder oportunidades de emprego, de namorar, de sair para um cinema, uma festa, uma praia. Os pacientes podem e devem se divertir, ser feliz, andar livremente”, destaca José Célio, vice-presidente da Psoríase Brasil, de 64 anos, que já sentiu na pele os sintomas da doença em sua forma grave. Diagnosticado com psoríase grave aos 17 anos de idade, José Célio teve uma crise da doença e ficou com mais de 80% do corpo tomado por escamas.

Para auxiliar os pacientes diagnosticados com PPG, assim como as demais psoríases e doenças crônicas de pele, nos últimos anos, a organização está focada em unir esforços com frentes parlamentares de psoríase e outras doenças crônicas de pele, visando envolver o poder público em ações em benefício dos pacientes. “A psoríase e outras doenças crônicas de pele, como o vitiligo, são negligenciadas pelo poder público. Por isso, estamos procurando iniciativas legislativas que façam com que o poder público tome atitudes para diagnóstico, disponibilização de profissionais, centros de referência e medicamentos para melhorar a vida dos pacientes”, finaliza José Célio.

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