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Pesquisa sobre a dengue alcança novos resultados em SC: estudo pode ajudar no combate à doença

Pesquisa sobre a fisiologia do mosquito pode ajudar a combatê-lo

• Atualizado

Redação

Por Redação

Pesquisadores alimentam mosquitos para experimentos | Foto: Camila Collato/Agecom UFSC
Pesquisadores alimentam mosquitos para experimentos | Foto: Camila Collato/Agecom UFSC

Um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) utiliza a fisiologia do mosquito Aedes aegypti – vetor de transmissão do vírus para os humanos – para estudar formas de combatê-lo.

Confira a reportagem

Vídeo: SCC SBT

Pesquisa da UFSC investiga como os mosquitos vetores toleram infecções por arbovírus

Um organismo pequeno, mas complexo, que se alimenta de sangue e é capaz de se reproduzir rapidamente, gerando situação de emergência em diversas regiões de Santa Catarina.

O inseto, que também é vetor de transmissão do zika vírus e chikungunya, é o objeto de pesquisa do Laboratório de Imunobiologia e Doenças Infecciosas (Lidi) da UFSC, coordenado pelo professor José Henrique Oliveira e por outros docentes do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia. Ele investiga como mosquitos vetores toleram infecções por arbovírus – aqueles que são transmitidos por insetos que se alimentam de sangue.

Tolerância, nesse caso, tem relação com a capacidade do mosquito de não ser prejudicado pelo vírus que, nos humanos, pode causar sintomas dolorosos e levar à morte. “O meu objetivo primário é entender essa biologia, é pensar em intervenções capazes de inibir esse processo de tolerância que nós chamamos de um processo adaptativo”, explica Oliveira.

No caso do Aedes, explica o pesquisador, o inseto é alimentado pelo sangue contaminado, beneficia-se dos seus nutrientes e carrega o vírus para novos hospedeiros, beneficiando também o micro-organismo. Uma das grandes questões para a ciência básica, portanto, seria descobrir e quantificar o nível de tolerância do mosquito ao agente causador da dengue.

“Então, aqui, a gente descreveu um método para quantificar a tolerância. Talvez essa seja a fase mais significativa desse trabalho: a descrição de um método para quantificar tolerância em mosquitos. Isso nunca foi feito”, explica o professor, cujo trabalho, que pode viabilizar um conjunto de outros estudos sobre a temática, está em estágio de pré-print.

O professor lembra que a primeira característica de uma pergunta, de uma problemática científica, é que ela possa ser parametrizada, quantificada. Esse método permite transformar a tolerância de um Aedes aegypti em um dado concreto sobre quanto ele é capaz de resistir ao vírus. “A gente explorou o que eu chamo de uma curva dose-resposta: a dose de patógeno e a resposta que ele causa na saúde do mosquito. E agora a gente sabe medir”. Esse processo vai permitir que novas perguntas científicas sobre o inseto sejam respondidas de um modo mais assertivo.

Outro aspecto importante do estudo é que a ferramenta também é capaz de gerar um dado sobre mosquitos mais ou menos tolerantes em diferentes cidades. Isso significa estimar quais populações estariam mais propensas a serem vetores de transmissão da doença – dado que pode antecipar políticas públicas e de prevenção. A equipe trabalha com mosquitos criados para serem super suscetíveis à dengue, com o genoma totalmente sequenciado. O vírus também não é o que circula no ambiente, mas um produzido em laboratório.

Ciência aplicada também ganha com ferramenta

Com a ferramenta desenvolvida pela equipe da UFSC, a ciência aplicada também ganha, afirma a universidade. Isso porque será possível trabalhar com o que os cientistas chamam de um teste de candidatos a moduladores da tolerância – critérios que possam ser pesquisados para impactar na sobrevivência dos insetos: genes a serem silenciados, aspectos fisiológicos que possam ser modificados, etc.

“A gente está numa situação de avanço conceitual para fazer a modulação e inibição da tolerância. Então, se eu identifico genes que promovem tolerância no mosquito, esse genes são alvo das pesquisas. Aí eu posso inibir esse genes no mundo real e, quando o mosquito picar uma pessoa com dengue, ele vai morrer da doença”, sintetiza.

O professor da UFSC foi um dos precursores dessa técnica no Brasil, onde há pelo menos dez anos vem inibindo a função de genes em mosquitos por uma técnica chamada de RNA de interferência (RNAi). “O RNAi é um método fundamental na biologia de vetores, pois permite interrogar a função de genes. Você tira determinado gene do sistema e pergunta o que mudou no sistema. O que acontece quando eu tiro isso daqui? E então você vê a diferença e faz uma uma inferência causal a partir desse fenótipo”, explica.

Mosquitos contaminados podem voar mais?

Um estudo de mestrado em fase de finalização realizado no Lidi trata de outra métrica para quantificar a saúde do inseto: o seu voo. “Nós criamos uma forma de quantificar o voo induzido, assumindo que podemos fazer uma correlação de quanto um mosquito voa e quão saudável ele está”, explica.

A pesquisa leva em conta que o Aedes não apenas é tolerante e permanece vivo com o vírus, como está fisiologicamente competente para voar e procurar novos indivíduos para disseminar o micro-organismo. “Em experimentos ainda não publicados, mostramos que algumas cepas de dengue vírus aumentam a capacidade de voo dos mosquitos infectados, um comportamento adaptativo que pode ter relação com a transmissão de dengue vírus para humanos”, comenta.

Os cientistas descobriram isso na pesquisa realizada pelo mestrando Diego Novak, que tem como tema a modulação comportamental do Aedes aegypti quando infectado pelo vírus da dengue. No estudo, insetos são infectados com diferentes proporções de dengue 4 e comparados com grupo de controle. Já nas primeiras 24 horas, os contaminados, mesmo mais pesados por conta do alimento, já estão voando mais. “E voar mais maximiza a chance de sobrevivência e transmissão do vírus da dengue”, explica.

O professor chama esse processo de uma dança evolutiva relacionada à tolerância. “Isso é bom para os dois: o mosquito ‘quer viver’ e o vírus ‘quer ser transmitido’”. Só que o vírus faz mais: ele faz um mosquito voar mais com 21 dias quando o mosquito é um vetor, e isso é uma descoberta feita aqui no laboratório a partir desse parâmetro de saúde (voo induzido) que a gente tá adaptando aqui no laboratório”, conta.

O clima tem impacto na vida do mosquito?

A estudante de iniciação científica Giovana Jover Campos também está tentando entender a tolerância dos mosquitos transmissores da dengue, mas na perspectiva climática. O professor lembra que o aquecimento global tem redefinido as fronteiras de transmissão de doenças causadas por vetores.

“Os insetos são muito suscetíveis às intempéries climáticas. Alguns locais muito quentes que são habitados por mosquitos deixarão de ser habitados por mosquitos, porque vai ficar quente demais para o inseto”, explica. Há, também, outros locais frios demais ou temperados que passarão a ser fronteiras de presença de inseto. “A dengue em Santa Catarina é um exemplo clássico”.

Essas fronteiras de expansão das doenças tendem a se alterar de acordo com as variações climáticas, por isso é importante antecipar as medidas de prevenção, reforça o cientista. Os estudos dessa linha fazem um ensaio comportamental e fisiológico de mosquitos submetidos a variação de temperatura.

“Quando o mosquito come sangue ele tem uma adatapção fisiológica que faz ele retornar mais rápido desse coma induzido provocado pelo frio”, conta o professor. “O que a gente vai fazer agora é medir o tempo de recuperação do coma induzido pelo frio”, reforça. O estudo, que ainda está em fase inicial, poderá embasar outros projetos de pesquisa a serem submetidos a editais de financiamento.

Equipe busca diferentes soluções 

A relação entre nutrição de Aedes aegypti com aspectos imunológicos do mosquito também é outro interesse do laboratório, especificamente da pesquisa de doutorado de Emili Santos. A proposta é analisar parâmetros associados à subnutrição, como o tamanho da asa e do peso seco, e relacionar o impacto de deficiências nutricionais na performance imunológica do inseto. “Analisaremos a relação desses aspectos com mosquitos nutridos e subnutridos, isto é, será que mosquitos adultos maiores apresentam um sistema imune diferenciado daquele dos mosquitos menores? E buscaremos também verificar se há vias imunológicas que são afetadas por essas condições de nutrição diferenciadas”, explica.

Já a pesquisadora Mariana Maraschin da Rocha investiga novas soluções para o controle do vetor e da doença no país. “Nós acreditamos que os mecanismos de proteção antioxidante presentes durante a alimentação do mosquito contribuem para a tolerância durante a infecção por dengue”, aponta. Por isso, o silenciamento desses genes alvos poderá levar a possíveis alterações no tempo de vida do inseto e na disseminação do vírus no mosquito.

Como o Aedes aegypti também transmite o zika vírus, a equipe do Lidi investiga, ainda, essa outra doença, mas focada em seu tratamento. “O favipiravir é um fármaco utilizado para tratar doenças causadas por vírus de RNA, como Influenza e Covid-19, e tem potencial para reduzir infecções causadas pelo zika”, explica a pesquisadora Luiza Hubner. “Buscamos avaliar se a exposição do vírus zika ao favipiravir pode facilitar ou prejudicar a posterior infecção do Aedes aegypti”.

via UFSC

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