Prefeito de Criciúma fala que moradores de Casa de Passagem precisam trabalhar
A Casa de Passagem é um local para moradores em situação de rua. No espaço são oferecidos serviços como psicológico, médico, além de refeições e local para dormir
• Atualizado
Confira a nota de Repúdio da DPU
A Defensoria Pública da União (DPU) vem a público repudiar a manifestação do prefeito do Município de Criciúma, sr. Clésio Salvaro, divulgada em vídeo publicado no dia 10/05/2021, na página pessoal do prefeito no Instagram, no qual informa que o acolhimento de pessoas na Casa de Passagem de Criciúma está condicionado ao trabalho por parte do cidadão e que aquele que não obedecer à ordem municipal será expulso do local de acolhimento, sob argumento de que não lhe cabe “sustentar malandros”.
Desde o ano de 2017, a DPU vem recebendo inúmeras denúncias por parte de brasileiros e de estrangeiros no sentido de que a Casa de Passagem estaria funcionando de forma irregular, sem o corpo de funcionários adequado, com o constrangimento de pessoas ao trabalho obrigatório junto ao Município para que pudessem ter o direito ao pernoite no local e com a expulsão dos migrantes estrangeiros que estivessem ali abrigados.
Em virtude das ilegalidades relatadas, a DPU ajuizou Ação Civil Pública requerendo o restabelecimento do serviço de proteção social, no formato previsto em norma federal, e a determinação de acolhimento da população vulnerável sem que esta fosse coagida a trabalhar gratuitamente para o Município em troca do serviço público que lhe era oferecido, bem como que os migrantes estrangeiros, em sua grande maioria africanos e haitianos, fossem abrigados sem qualquer discriminação de origem nacional ou de cor.
O Juízo da 4ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Criciúma, no julgamento da ação proposta, reconheceu que ficou provada “a séria violação dos direitos fundamentais da população vulnerável que depende do serviço público de abrigamento e fornecimento de refeições na Casa de Passagem São José” e afirmou, ainda, que “houve um manifesto desmonte da estrutura da Casa de Passagem pela municipalidade, inclusive com exclusão injustificada de estrangeiros lá abrigados”.
Com base nesses argumentos, o Juízo Federal determinou que o Município de Criciúma desse cumprimento integral à norma federal que regula o funcionamento da Casa de Passagem, bem como o condenou ao pagamento de indenização pelo dano moral coletivo, no montante de R$ 200.000,00.
A Defensoria Pública da União esclarece que a Casa de Passagem foi criada para oferecer serviço essencial de abrigamento e de oferta de alimentação às pessoas em situação de vulnerabilidade social ou em situação de rua, extremamente fragilizadas pela miséria e pela exclusão que as levaram a contar com tal serviço de assistência social.
Ressalte-se que se mostra absolutamente ilegal a coação de acolhidos ao trabalho para que tenham acesso à Casa de Passagem, pois a oferta do abrigamento às pessoas carentes e necessitadas é um serviço público essencial e dever do Município, que é custeado por verba pública municipal e federal, advinda dos tributos pagos por toda a população.
Por fim, a Defensoria Pública da União manifesta seu compromisso com a garantia dos Direitos Fundamentais das pessoas carentes, especialmente fragilizadas pela fome e pela miséria que restou agravada no Brasil pela pandemia de covid-19, e informa que tomará todas as medidas judiciais cabíveis para o integral cumprimento da sentença proferida, a fim de que o Município de Criciúma ofereça à população os serviços da Casa de Passagem em conformidade com a norma federal que a criou, sem qualquer coação dos usuários e sem discriminação social, de cor ou de origem nacional dos acolhidos.
Prestação de serviço
No dia 4 de maio, em sentença em ação civil pública da Defensoria Pública da União (DPU), a Justiça Federal confirmou a ordem para que o município de Criciúma (SC) preste serviço socioassistencial adequado na Casa de Passagem São José, com o cumprimento integral da Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema Único de Assistência Social (Suas). Várias irregularidades na unidade foram denunciadas à DPU, que as constatou em vistorias e acionou a Justiça. A Casa de Passagem atende a população em situação de rua e em vulnerabilidade social, incluindo imigrantes, motivo pelo qual deve ser disponibilizado um tradutor. A juíza federal substituta Louise Hartmann, da 4ª Vara Federal de Criciúma, também condenou o município de Criciúma a pagar indenização de R$ 200 mil por dano moral coletivo.
Os relatos que chegaram à DPU em 2017, confirmados posteriormente por testemunhas durante o processo judicial, eram de que a Casa de Passagem estava fechada no período diurno desde março daquele ano, sem oferta de serviços mínimos de abrigamento, almoço e orientação social e psicológica. O motivo seria o remanejamento, para outro órgão da Secretaria da Assistência Social de Criciúma, de assistentes sociais, psicólogos, cozinheiros, faxineiros e um funcionário poliglota, responsável por auxiliar imigrantes. Também houve testemunhos sobre a exigência de os abrigados trabalharem em troca dos serviços prestados pela Casa e de que imigrantes teriam sido proibidos de pernoitar no local e sofrido confisco de bens.
A Casa de Passagem recebe verba do governo federal para despesas com funcionários, manutenção e alimentação dos abrigados. Apesar disso, em inspeção realizada em junho de 2017, a equipe da DPU verificou que o local estava fechado no período diurno, com restrição do serviço, falta de equipe técnica e de apoio, e que os próprios abrigados estavam cozinhando e limpando o estabelecimento. A ação civil pública foi ajuizada pela defensora pública federal Mariana Carraro em novembro do mesmo ano. Mesmo após a liminar de junho de 2019 para adequação dos serviços na unidade, a DPU voltou a constatar a falta de funcionários em número suficiente. “É preocupante que recursos públicos federais permaneçam sendo repassados pela União ao Município de Criciúma para o cofinanciamento de um serviço essencial à população vulnerável e que tais verbas não estejam sendo empregadas de forma apropriada”, destacou Carraro.
A pedido da defensora, a juíza indicou a quantidade de profissionais que devem trabalhar no local, com base na Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Suas: “considerando que a Casa de Passagem é idealizada (e inclusive recebe recursos federais com base neste número) para o acolhimento de até 50 usuários, é lógico e evidente (do que se depreende de uma mera subsunção do fato à norma) que a casa de acolhimento deve contar com 3 coordenadores de nível superior ou médio; 5 cuidadores de nível médio e qualificação específica; 5 auxiliares por turno; 3 assistentes sociais e 3 psicólogos”. Durante o processo, porém, ao menos três vezes a DPU noticiou à Justiça o descumprimento da decisão liminar.
“Destarte, segundo a prova testemunhal, houve um manifesto desmonte da estrutura da Casa de Passagem pela municipalidade, inclusive com exclusão injustificada de estrangeiros lá abrigados. Os relatos das testemunhas impressionam, porque demonstram que o Município réu, responsável pela prestação do serviço de assistência social, tratou os estrangeiros como se a situação de vulnerabilidade adviesse de preguiça ou vagabundagem, não de mazelas sociais, como, por exemplo, a incapacidade para o trabalho ou as dificuldades de comunicação e obtenção de ocupação remunerada por parte dos imigrantes. Enfim, ao que parece, na ótica do gestor municipal, a Casa de Passagem estava prestando um favor aos abrigados por liberalidade, quando, em verdade, trata-se de um dever estabelecido no ordenamento jurídico pátrio em face do Município, o qual, aliás, é custeado também com recursos federais”, afirmou a juíza Louise Hartmann, na sentença de 30 de março.
>> Para receber as informações mais importantes do dia pelo WhatsApp, gratuitamente, basta clicar AQUI!
>> PARA MAIS NOTÍCIAS, SIGA O SCC10 NO TWITTER, INSTAGRAM E FACEBOOK.
Quer receber notícias no seu whatsapp?
EU QUERO