Entidades e personalidades assinam carta em defesa do Pantanal
O documento foi lançado no último domingo (20)
• Atualizado
Por Estadão
Diante do incêndio que avança no Pantanal mato-grossense, que já teve 15% de sua área atingida pelas queimadas, entidades e personalidades se uniram para subscrever uma carta aberta em defesa do bioma. No documento, lançado no domingo, 20, os signatários acusam de omissão a gestão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e pedem a responsabilização dos responsáveis pela destruição do ecossistema.
“Não estamos diante de políticas públicas alternativas. Não estamos diante de projeto algum. O que estamos vendo é incompetência, ignorância, intolerância de um governo aos contornos da lei”, diz um trecho da manifestação. “É preciso, urgentemente, afastar de seus cargos os responsáveis pela destruição do território nacional e responsabilizá-los civil, penal, política e administrativamente, evidentemente dentro dos cânones do devido processo legal”.
Advogados, procuradores de Justiça, defensores públicos, professores, biólogos e outros profissionais assinaram a carta. Entre as personalidades, estão o ex-jogador de futebol e comentarista esportivo Walter Casagrande, a ex-jogadora de vôlei Ana Beatriz Moser, o jornalista Juca Kfouri, a atriz Inez Viana, a cineasta Ana Tendler e o ator Antonio Grassi.
Entidades e associações de juristas e de defesa do meio ambiente também endossaram a manifestações, a exemplo da Associação Juízes para a Democracia (AJD), do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública (IBAP), da Comissão do Meio Ambiente da OAB de São Paulo e do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (PROAM).
“A história cobrará do Poder Judiciário e de todas as funções essenciais à Justiça por todo o silêncio conivente para com este processo de lesa-pátria que estamos, estarrecidos, acompanhando nos últimos meses”, conclui a carta.
Leia a íntegra da manifestação:
CARTA EM DEFESA DO PANTANAL MATOGROSSENSE
Estamos em meio a uma guerra conflagrada.
O Pantanal Matogrossense, bioma protegido constitucionalmente, está gravemente ferido, se não irremediavelmente destruído por chamas criminosas e omissão governamental. As instituições contemplam passivamente a situação. Alguns jornais dão amplo destaque ao assunto, constituindo exceção à regra; outros colocam notas laterais a respeito do assunto, quando muito tratando do tema como notícia-mercadoria que só interessa na medida em que fomenta o aumento de publicidade. A voz do Ministério Público é praticamente inaudível diante do ruído generalizado da pandemia. A Advocacia Pública é acuada em sua missão quando os chefes das pessoas jurídicas de direito público interno buscam obrigá-la a atender servilmente aos seus desmandos. E o Poder Judiciário, quando instado, responde com uma lentidão exasperante, parecendo não vislumbrar uma tragédia de proporções planetárias que não será evitada com simples palavras amigas ao meio ambiente em acórdãos ineficazes.
Guerra conflagrada em todos os sentidos do verbo: pelo fogo, pela pusilanimidade, por dolo. Em meio a uma hipócrita afirmação de compromisso com a sustentabilidade, silencia o agronegócio, que fomentou a destruição do regime democrático construído em 1988.Todos silenciam. Apenas aqui e ali, em redes sociais minúsculas, um ou outro colega posta um link para compartilhar seu desconforto.
O art. 225 da CF dispõe em seu § 4º: A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
Por omissão, os atuais ocupantes dos postos de chefia do Poder Executivo estão arrasando este patrimônio nacional. Contam com o beneplácito de parte do Congresso Nacional que, afável ao setor econômico de base agrária, só está interessada na expansão de território (inclusive com grilagem) para o plantio de soja e para pecuária extensiva. Aos olhos de todos, a boiada está passando, exatamente da forma que o Sr. Ricardo Salles conclamou no imoral e antipatriótico pronunciamento levado a público há poucos meses, em reunião ministerial.
Neste momento, a quase totalidade de um ecossistema único – em sua relevância ecológica, em sua beleza estética, em seu potencial econômico, em sua história e cultura que fizeram parte da formação do conceito de nação brasileira – está sendo transformada em cinzas.
Constitui um imperativo a todos aqueles que se submetem ao comando da Constituição da República Federativa do Brasil que se dê um enérgico basta a este quadro de destruição do país. Não estamos diante de políticas públicas alternativas. Não estamos diante de projeto algum. O que estamos vendo é incompetência, ignorância, intolerância de um governo aos contornos da lei.
É preciso, urgentemente, afastar de seus cargos os responsáveis pela destruição do território nacional e responsabilizá-los civil, penal, política e administrativamente, evidentemente dentro dos cânones do devido processo legal, garantia constitucional que vem sendo tão covardemente ultrajada nos últimos tempos.
A história cobrará do Poder Judiciário e de todas as funções essenciais à Justiça por todo o silêncio conivente para com este processo de lesa-pátria que estamos, estarrecidos, acompanhando nos últimos meses.
Brasil, 20 de setembro de 2020
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