Brasil poderá ter passaporte sanitário; entenda como funcionará
O projeto prevê a criação de um documento que será emitido pelo Ministério da Saúde e deverá ser apresentado no embarque ou desembarque.
• Atualizado
Com o objetivo de estimular viagens internacionais e dar início à retomada econômica do setor de turismo, parlamentares da Câmara dos Deputados propuseram um projeto de lei que visa a criação de um passaporte sanitário no país. No entanto, especialistas ponderam que a medida pode se tornar um instrumento de desigualdade em relação à epidemia, limitando direitos e liberdades individuais.
Elaborado pelo deputado Geninho Zuliani (DEM-SP), o projeto prevê a criação de um documento que será emitido pelo Ministério da Saúde e deverá ser apresentado no embarque ou desembarque — aéreo ou terrestre –, ou durante a hospedagem, pelos viajantes. Segundo Zuliani, a medida tem como base as propostas que foram desenvolvidas por países pertencentes à União Europeia (UE) e pelos Estados Unidos.
“A vacinação está evoluindo em países desenvolvidos, como os EUA, que inclusive passaram a oferecer vacinas aos turistas”, disse o parlamentar, referindo-se ao plano de imunização anunciado pelo prefeito de Nova York, Bill de Blasio. “Falam em terceira onda, mas não sabemos se terá uma quarta (onda) ou se vamos conviver com a pandemia por mais 6 meses ou mais 5 anos […] então, pensando nisso e observando o cenário mundial, trouxemos a ideia do passaporte sanitário”, explicou, durante audiência pública na Câmara.
Ainda segundo o deputado, o passaporte sanitário será uma versão digital da caderneta de vacinação — com detalhes acerca da imunização contra a covid-19 — que vai permitir o deslocamento de turistas pelo país. “Em um aplicativo quase on-line, será possível identificar onde o indivíduo recebeu a vacina ou se ele já contraiu a doença.”
Na avaliação do professor Fernando Aith, diretor do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário, ligado à Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), a proposta tem pouco sentido. “Os Estados Unidos e a Europa estão fazendo isso porque eles sabem que em breve terão vacinas disponíveis para toda a população. Internamente (o documento) pode ter algum aproveitamento, mas eu ainda não vejo muito espaço para uma utilidade prática”, pontuou.
Aumento das desigualdades sociais
Com o surgimento de novas variantes da covid-19 e o aumento de casos e mortes provocados pela doença, autoridades de países da Europa decidiram fechar as fronteiras e impedir que viajantes de nações mais afetadas pela pandemia ingressassem em seus territórios. Recentemente, o Parlamento Europeu aprovou o projeto para criar o passaporte verde (também chamado de Certificado Digital Verde), que autoriza a entrada de turistas na região.
Entretanto, a União Europeia defende que somente as pessoas que foram imunizadas com vacinas aprovadas pelo bloco — Pfizer, Moderna, AstraZeneca e Johnson & Johnson — possam ter acesso aos países. Turistas que receberam doses da CoronaVac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac, estariam impedidos de viajar para essas regiões.
“Com isso, não adianta eu ter o passaporte sanitário com a vacina da CoronaVac se a Europa não está aceitando. É necessário combinar com a Europa se eles vão aceitar as informações fornecidas pelo governo brasileiro e, até agora, nada disso está certo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) não está querendo tocar no assunto e os países estão tomando medidas individuais”, reforçou Aith.
Segundo o secretário Nacional de Desenvolvimento e Competitividade do Turismo, William França, existe uma dificuldade para definir o que será exigido no exterior e de que maneira o Brasil será inserido nesse contexto. Durante audiência pública na Câmara, França afirmou que o ministro do Turismo, Gilson Machado Neto, solicitou um posicionamento das entidades responsáveis.
“O ministro fez uma provocação, pedindo que a Organização Mundial do Turismo (OMT) converse com a OMS para estabelecer um conjunto de vacinas que sejam válidas. Essa confusão em torno de qual vacina pode e qual não pode será o maior gargalo”, reforçou o secretário, que se diz favorável a implementação do documento no Brasil.
Por fim, o professor ressalta que o passaporte sanitário pode contribuir com o aumento das desigualdades sociais. “À medida que eu tenho parte da população com liberdade para viajar internacionalmente, pois tiveram acesso às vacinas, a outra parcela ficará enclausurada. A gente só vai ter uma iniquidade muito maior no nosso país com relação à epidemia e a direitos e liberdades individuais associados a uma vacina, que deveria ser pública e universal, mas que por enquanto está destinada a poucos grupos.”
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