A conta chegou: descontrole fiscal pressiona câmbio, juros e inflação
Câmbio a R$ 6,00, juros futuros em 15% e inflação acima da meta. Esses são os reflexos do populismo na economia brasileira
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Não há razão para surpresa. Os desequilíbrios econômicos que vieram à tona na semana passada, após um pronunciamento desastroso do Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apenas confirmam o roteiro que já havia previsto nesta coluna em 2022. Naquela ocasião, alertei que o PT não demonstrava compromisso com o desenvolvimento econômico e as propostas do então presidente eleito, Lula, levariam inevitavelmente o governo a enfrentar um dilema: crise ou estelionato eleitoral. Lula já fez sua escolha. Optou pelo populismo fiscal na tentativa de assegurar a permanência de seu partido no poder, ainda que isso comprometa a estabilidade econômica do país.
Ao longo de 2024, testemunhamos uma deterioração significativa dos fundamentos macroeconômicos do país. O primeiro Relatório Focus do ano — publicação semanal do Banco Central que reúne as expectativas do mercado para os principais indicadores econômicos — projetava um cenário relativamente estável para o fim de 2024: inflação dentro da meta (3,90%), câmbio a R$ 5,00, taxa Selic de 9,00% e crescimento real do PIB de 1,6%. Embora o PIB deva crescer o dobro do esperado, impulsionado pelo forte estímulo fiscal dos últimos dois anos e pelas reformas econômicas realizadas em gestões anteriores, os sinais de desequilíbrio são claros. A inflação de outubro (4,76%) já superou o teto da meta (4,5%) e mantém tendência de alta; o câmbio se consolidou próximo a R$ 6,00; e a taxa Selic, atualmente em 11,25%, tem o mercado precificando um patamar de 15% no fim do ciclo de aperto monetário.
Contudo, o crescimento econômico acima do esperado atualmente não é sustentável, uma vez que o governo está, na prática, tomando emprestado o crescimento futuro da economia. Esse cenário é agravado pelo aumento expressivo do déficit público, que alcançou 9,33% do PIB entre janeiro e setembro de 2024, e pela elevação de sete pontos percentuais na dívida pública, configurando uma dinâmica econômica altamente desafiadora para o país. Ainda mais preocupante do que a irresponsabilidade fiscal em curso foi a desestruturação das regras fiscais brasileiras, que, até então, asseguravam algum nível de previsibilidade e controle sobre os gastos públicos.
A chamada “PEC da Transição” — um eufemismo para o que deveria ser chamado de “PEC do Inferno Fiscal” — escancarou as portas do descontrole fiscal ao autorizar gastos de R$ 200 bilhões fora do Teto. Não satisfeitos, o governo eliminou o Teto de Gastos e implementou um novo arcabouço fiscal que institucionaliza o aumento real dos gastos públicos. Além disso, tramita no Congresso a regulamentação infraconstitucional da Reforma Tributária, que deve resultar em uma maior carga tributária e na destruição do sistema federativo brasileiro, ao centralizar a arrecadação de impostos em Brasília, em detrimento de estados e municípios.
A reação negativa do mercado financeiro ao pronunciamento de Fernando Haddad apenas antecipou o que qualquer pessoa minimamente atenta ao histórico e às promessas de campanha do PT já sabia que ia acontecer. Compromisso com o futuro econômico do país? Nenhum. O único compromisso do governo é com o partido e os “donos do poder” de Brasília. A hipocrisia atinge níveis olímpicos quando o governo ainda tenta justificar o aumento desenfreado dos gastos públicos sob o vazio conceito de “justiça social”. O que se obtém com isso? Inflação, que dilacera o poder de compra dos mais pobres; aumento de impostos, que sufoca a classe média e os empreendedores; e juros estratosféricos, que garantem aos ricos uma vida tranquila sem riscos, afinal, eles têm o “governo dos pobres” para lhes pagar mais de R$ 1 trilhão por ano em juros.
A realidade desesperadora é que não precisaríamos estar enfrentando essa situação. Com a queda das taxas de juros na Europa e nos Estados Unidos, era de se esperar que a pressão sobre o câmbio diminuísse. Vale lembrar que, quando o dólar ultrapassou os R$ 5,80 no governo Bolsonaro, os juros brasileiros estavam no patamar mais baixo da história, com taxas reais negativas, em meio à profunda incerteza trazida pela pandemia. Hoje, em um contexto global mais favorável, não existem justificativas externas para explicar o porquê do real ser a moeda com maior depreciação entre as economias mais relevantes do mundo. Esse cenário é o reflexo de escolhas internas equivocadas que colocam o país em uma posição desnecessariamente desfavorável.
Ao mesmo tempo, o cenário geopolítico global apresenta oportunidades estruturais únicas para o Brasil. O país tem o potencial de se tornar a “Arábia Saudita” da energia verde, liderando a transição energética no mundo. Com o distanciamento crescente entre as economias ocidentais e a China, o Brasil está em uma posição privilegiada para atrair investimentos e se tornar um ponto estratégico no realinhamento das cadeias globais de produção. Somos uma nação alinhada com os valores ocidentais, mas que também mantém a habilidade de dialogar com todos e que poderia oferecer um parque industrial competitivo e com baixo impacto ambiental. Além disso, no contexto das tensões comerciais entre Oriente e Ocidente, o Brasil pode fortalecer ainda mais sua vocação como grande celeiro do mundo, ampliando sua capacidade de alimentar populações em escala global e consolidando sua relevância no comércio internacional.
Infelizmente, a história se repete. Durante os governos Lula 1 e 2, o Brasil teve a rara oportunidade de aproveitar o boom das commodities e o avanço da globalização para implementar reformas econômicas e políticas capazes de transformar o país em uma economia aberta, dinâmica e competitiva. No entanto, escolhemos o caminho do populismo e da corrupção, o que não apenas estagnou nossa economia como também minou a credibilidade das instituições de Estado. Agora, sob o governo Lula 3, perdemos mais uma vez o “bonde” do desenvolvimento. Voltamos ao discurso sedutor do paternalismo bandoleiro tão característico da América Latina, no qual o governo fornece o peixe, mas não ensina a pescar, para, em seguida, tirar metade do peixe dos cidadãos por meio de impostos e inflação.
Se não retomarmos urgentemente uma trajetória de controle nos gastos públicos, o Brasil caminhará para um cenário de dominância fiscal, onde a política monetária perde sua eficácia no combate à inflação. O Brasil não precisaria seguir os passos da política “motosserra” radical de Javier Milei na Argentina. No entanto, pelo andar da carruagem, o medo que sentimos em 2022 pode se transformar na nossa grande esperança para 2026: teremos que nos tornar uma Argentina. Afinal, não podemos ser o cônjuge ingênuo que acredita que mudará o parceiro depois do casamento. O PT, em sua essência, sempre foi movido por uma compulsão por gastar, gastar e gastar. E para nós, cidadãos que pagam a conta, só resta o mesmo desejo que um ex-ministro da Fazenda, frustrado e “enganado” pelo atual governo, fez questão de expressar: boa sorte! Precisaremos dela, e muito.
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