Carreira e Dialética
O que você queria ser quando crescesse? Por trás daquelas ingênuas escolhas existiam motivações que valem muito à pena serem revisitadas.
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Na minha primeira coluna iniciei a reflexão com algumas perguntas. O texto não trouxe respostas para elas, é verdade, mas a intenção não era mesmo essa. Gosto de provocar, de desacomodar, fazer convites para as pessoas repensarem aquilo que usualmente é visto como senso comum. Sou fã da dialética, para cada tese, uma antítese. Quanto à síntese, acredito que a busca deva ser de cada um.
Num mundo hiperconectado, com absolutamente tudo à distância de um clique, sofremos overdoses diárias de conteúdo. Como se não bastasse uma pandemia, vivemos a era da infodemia*. Some-se a isso um espírito do tempo que convida mais a certezas instantâneas do que à convivência pacífica com a angústia que nos move, e teremos pessoas apressadas em construir resoluções rápidas – e ineficazes.
O tema carreira é uma constante nas minhas andanças corporativas. Trabalho com gestão de pessoas há mais de 17 anos e atuei em diversos tipos de empresa. De indústria tradicional, à mídia e comunicação, até o mundo da tecnologia e inovação, independente dos cenários e de perfis profissionais tão diferentes, essa conversa acaba tendo variações do mesmo tom. A empresa tem plano de carreira? O que posso fazer para crescer aqui dentro? O que a empresa oferece para o meu desenvolvimento? Neste caso, perguntas nada retóricas. Pelo contrário, o que estas perguntas revelam, é uma busca de tutoria para um assunto que deveria ser pessoal e intransferível.
O universo é tão grande para dentro quanto para fora
Enquanto vamos buscando as respostas no ambiente externo, muitas vezes deixamos de procurá-las onde realmente estão. Se a saída é para dentro, o autoconhecimento é a chave que destranca essa porta. Mas na nossa trajetória, quase ninguém nos disse isso. Nosso sistema educacional formal, com a devida ressalva dessa generalização, nos leva na direção oposta ao filosófico e belo torna-te quem tu és, buscando a reprodução das fórmulas de sucesso que levam aos rankings dos vestibulares. E assim vamos perdendo contato conosco mesmos.
O que você queria ser quando crescesse? Por trás daquelas ingênuas escolhas existiam motivações que valem muito à pena serem revisitadas. E hoje, pensando bem, que marca você quer deixar no mundo? Para nos aproximar da linguagem dos negócios, pergunte-se ainda, qual é a sua proposta de valor? Perceba que eu não estou falando de cargos a serem ocupados, estou falando de entrega, de impacto, ou se quiser, de propósito. Aquilo que é possível ser realizado nas mais diferentes funções, aquilo que atravessa e costura a velha e ultrapassada dicotomia do pessoal/profissional e que nos torna únicos.
Agora pense na jornada: caminhos que você quer percorrer, aprendizados que deseja ter, bagagem que tem vontade de acumular. E então, mova-se. Pequenos ou grandes passos, tentativas, experimentações. Procure trabalhar em lugares que praticam o ganha-ganha na relação com os seus colaboradores: enquanto você se desenvolve e realiza o seu propósito, você contribui com os seus melhores resultados. Sempre que possível, busque trabalhar com pessoas que te incentivem a ser a melhor versão de você mesmo. Ouse não fazer apenas o que te pedem, ou o que está previsto no seu escopo atual. Ouse fazer mais pelo simples prazer de se desafiar e aprender algo novo. Ouse abrir espaço e ocupar espaços cada vez maiores. Ouse tomar a responsabilidade para si e nunca se acomodar.
Pergunte-se se você é hoje um profissional melhor do que no ano passado. Repita a cada período de tempo, o seu tempo. Mas cuidado, não tenha somente cargo e salário como indicadores de sucesso, eles são importantes, mas não dizem tudo. E o mais essencial, não mire no resultado ou na recompensa, cada movimento é válido por ele mesmo. Aproveite a jornada.
*Infodemia: excesso de informação sobre determinado tema, por vezes incorreta e produzida por fontes não verificadas ou pouco fiáveis, que se propaga velozmente.
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