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Lava Jato

“Se tornou perigoso combater a corrupção”, diz Deltan Dallagnol sobre Brasil

Alvo do TCU por uso de verbas públicas, ex-coordenador da Lava Jato acusa 'vingança' e critica ministros

• Atualizado

SBT News

Por SBT News

Foto: Marcello Camargo/Agência Brasil
Foto: Marcello Camargo/Agência Brasil

“Se tornou perigoso combater a corrupção no Brasil”. É o que afirma o ex-procurador da Lava Jato Deltan Dallagnol – pré-candidato a deputado federal pelo PODEMOS, do Paraná. “O que a gente vê hoje são corruptos soltos, processos anulados, enquanto quem está pagando é quem combateu a corrupção”.

Nesta semana, o Tribunal de Contas da União (TCU) abriu um processo para apurar suposto desvio milionário de diárias de viagem pagas aos procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Os alvos principais são Dallagnol e o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. 

Em entrevista ao SBT News, Dallagnol afirmou que é “revanchismo” do corpo político do tribunal. “Vários dos ministros do Tribunal de Contas são pessoas que foram delatadas em casos da Lava Jato, eles, os filhos deles”.

“O Tribunal de Contas da União está querendo subverter toda aquilo que foi e é considerado legal até hoje para dizer que supostamente seria ilegal e colocar nas nossas costas. É uma vingança”, afirmou. “Estão tentando distorcer a realidade, criar alguma coisa para tentar fazer com que ninguém nunca mais ouse enfrentar os poderosos corruptos do Brasil”.

Dallagnol afirma que não recebeu diárias, nem autorizou qualquer pagamento, como sustenta o relator do processo no TCU, ministro Bruno Dantas — a quem criticou e associou ao senador Renan Calheiros (MDB-AL) — “um inimigo da Lava Jato”.

Estreante na política, Dallagnol foi condenado em março pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) a indenizar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por danos morais, no caso do famigerado power point. “Uma decisão absurda. Eu simplesmente estava fazendo o meu trabalho, cumprindo o meu dever”. Ao SBT News, ele falou ainda sobre sua meta de encampar projeto que busca uma renovação recorde de parlamentares no Congresso e sobre os motivos que o levaram a entrar no Podemos e não acompanhar o ex-juiz Sérgio Moro, que migrou para o União Brasil. 

SBT News – O TCU abriu processo nesta semana para apurar um suposto rombo milionário com passagens e diárias do MPF e procuradores da Lava Jato. Houve desvio de dinheiro público?

Deltan Dallagnol – O Tribunal de Contas da União está querendo colocar todo custo do combate à corrupção, empregado para recuperar R$ 15 bilhões para a sociedade, nas costas dos procuradores. Isso é o maior absurdo. O que a gente fez foi usar o modelo existente e previsto em lei para trazer procuradores que eram especialistas em combate à corrupção, em cooperação internacional, em lavagem de dinheiro, para atuar na Lava Jato. Justamente para fazer a Lava Jato possível. É o que várias empresas fazem. Quando você traz outras pessoas, que moram em outro estados e cidades, você precisa custear as despesas, pagar as passagens aéreas, pagar hotel, alimentação. Isso é o que está previsto na lei. Aliás, é o que é feito até hoje, na Procuradoria-Geral da República (PGR), no Conselho Nacional do Ministério Público, no Conselho Nacional de Justiça.

Mas o Tribunal de Contas da União está querendo subverter toda aquilo que foi considerado legal e é considerado até hoje para dizer que supostamente seria ilegal e colocar nas nossas costas. É revanchismo, uma vingança, uma inversão de valores para tentar se vingar de quem combateu a corrupção e desincentivar o combate à corrupção no futuro.

SBT News – O ministro Bruno Dantas, relator do caso no TCU, ressalta que houve “um modelo de pagamento reiterado e ilimitado”. A força-tarefa criou um mecanismo para aumentar os ganhos com verba de passagens e diárias de viagens?

Deltan – É claro que não. O que foi feito é o modelo legal para viabilizar a existência da força-tarefa, seguindo a lei. Quem diz que isso foi legal não é Deltan, os procuradores-gerais da República que atuaram na Lava Jato, e não foi só o (Rodrigo) Janot, foram três, os secretários-gerais da PGR, os procuradores-chefes, a auditoria interna do Ministério Público, todos consideraram legais os pagamentos. E mais, o próprio corpo técnico do Tribunal de Contas da União. 
Quem que está agora querendo dizer que isso e ilegal, contra todo mundo, é o corpo político do Tribunal de Contas. São os políticos que estão lá usando toga.
E o ministro Bruno Dantas, que está conduzindo isso, a gente precisa saber quem ele é: apadrinhado de Renan Calheiros (senador do MDB/AL), que é uma pessoa que vê a Lava Jato como inimiga, que estava no evento político de lançamento da candidatura do Lula. Como alguém assim, que está apoiando a candidatura do Lula, pode atuar em um caso em relação à Lava Jato? Vários dos ministros do Tribunal de Contas são pessoas que foram delatadas em casos da Lava Jato, eles, os filhos deles. O que a gente vê hoje é um grande revanchismo, uma tentativa de vingança. 

SBT News – Falou-se na emissão de um boleto de cobrança de quase R$ 3 milhões pelo TCU. O senhor já recebeu essa cobrança? E vai pagar? 

Deltan – Isso mostra que se tornou perigoso combater a corrupção no Brasil. É essa a mensagem que eles querem passar. Querem que nenhum procurador, juiz, ouse no futuro lutar de novo contra os grandes poderosos. Eu não recebi essas diárias, e eu não autorizei essas diárias. Por que eles tentam me responsabilizar? Alegam que notoriamente eu fui coordenador da Lava Jato. Mas eu era coordenador da atividade nos processos e investigações. Quem cuida de pagamento de salários, de verbas, de compra de papel e de atividades administrativas, é a Procuradoria-Geral da República. Eu não tinha nada a ver com isso. 

E quem está fazendo isso são ministros que passam um terço do ano viajando com dinheiro público, que foram para a Europa e Ásia, com R$ 40 mil gastos em diárias, que foram passar 12 dias em Paris, Lisboa, com tudo pago. É uma total inversão de valores. O que a gente vê hoje são corruptos soltos, a gente vê processos anulados e corruptos com dinheiro no bolso, em razão disso, enquanto quem está pagando é quem combateu a corrupção. . 

SBT News – O processo no TCU não é o primeiro revés na Lava Jato. Recentemente, o STJ o condenou a pagar indenização por dano moral a Lula. Outras derrotas virão?

Deltan – Desde 2015, a gente antecipava isso, a gente falava ‘vai existir uma reação contra o combate à corrupção’. Porque é o que a gente viu na Itália, na Grécia, na Romênia. Sempre que promotores e juízes trabalham de modo firme, consistente e colocam a cara a tapa contra a corrupção, o sistema político em um momento, ele se reorganiza e ele reage. Ele reage para buscar a própria impunidade. Mas no Brasil, como disse o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, eles não querem só a impunidade, eles querem mais, querem vingança contra os promotores e juízes que ousaram combater a corrupção. 

Basta olhar o que aconteceu ao longo da história. Sempre que houve uma rebelião contra o status quo, contra os poderosos, eles enforcaram os líderes da rebelião. E a Lava Jato, a gente pode olhar ela como uma espécie de rebelião contra os corruptos, uma rebelião dentro da lei, contra os poderosos que comandam o país, que nos saqueiam há décadas. 

SBT News – Olhando para trás, toda a Lava Jato foi perdida? E quais erros ajudaram nisso?

Deltan – Hoje a Lava Jato e o combate à corrupção não pagam por eventuais erros. Pagam pelos acertos, por ter colocado corruptos poderosos atrás das grades como nunca aconteceu em séculos no Brasil. Essa é a razão da reação contra a Lava Jato. É a razão do esvaziamento do combate à corrupção que está acontecendo. E se você perguntar quanto já foi destruído, pelas nossas pesquisas aqui, menos de 20% foi destruído. Claro que eram casos simbólicos. 
O problema é que as decisões que estão destruindo esses cinco, dez, quinze casos criminais, são razões que podem ser usadas nos outros mais de noventa casos criminais que estão lá pendentes de julgamento. Então, quando o Supremo Tribunal Federal muda a regra em relação à competência, onde deve ser julgado um caso, em Curitiba ou em Brasília, ou muda a regra em relação à competência, onde deve ser julgado um caso, na Justiça Federal ou Eleitoral, e permite que essa nova regra seja aplicada para o passado, isso permite que uma série de casos sejam anulados. Aí eles (ministros do STF) vão examinando um a um, e vão derrubando e derrubando. 

Agora, se me perguntar se, apesar dessas derrotas parciais recentes, se valeu a pena a Lava Jato, se alcançou bons resultados, digo que a Lava Jato alcançou três resultados inéditos: primeiro, vários corruptos poderosos foram parar atrás das grades e foram soltos por decisão do Supremo Tribunal Federal, que impediu a prisão em segunda instância, senão, continuariam presos; segundo lugar, foram recuperados bilhões de reais para a sociedade, entregues e devolvidos por criminosos confessos, e esse dinheiro ainda está nos cofres públicos e a gente vai lutar para que permaneça nos cofres públicos; em terceiro, foi revelado o monstro da corrupção brasileira, e esse diagnóstico (…) da grande corrupção é algo que não tem preço. Esse diagnóstico nos permite agora lutar por mudança.

Hoje, o que está acontecendo, é que eles fizeram tantas mudanças nas leis, nas decisões, proibindo prisão em segunda instância, mudando regra da colaboração premiada, mudando regra de prisão preventiva, acabando com a improbidade administrativa, eles mudaram tanto, que hoje é mais difícil você combater a corrupção do que era no passado. 

SBT News – O senhor deixou o MPF em 2021 e entrou no PODEMOS junto com o ex-juiz Sergio Moro, que depois migrou para o União Brasil na tentativa de se candidatar a presidente. Por que não o acompanhou nessa mudança?

Deltan – As razões pelas quais entrei no Podemos foram três: a primeira é que o partido tem votado a favor do combate à corrupção de um modo muito consistente nos últimos anos; segundo é que quando você sai de um ambiente em que você está seguro, como o Ministério Público, e vai para um ambiente político, em que o que conhece é o que de pior existe nele, os conchavos, a corrupção que você investigou, quer ir para um lugar em que você tenha alguma referência, e dentro do Podemos no Paraná estão três senadores que têm atuado não só contra a corrupção, mas em relação aos quais jamais surgiu qualquer notícia de crimes praticados, de desvios praticados, que são os senadores Oriovisto Guimarães, Flávio Arns e Álvaro Dias; e terceiro foi que o partido que me deu liberdade para eu defender uma causa suprapartidária, que é a da renovação legislativa, apoiando o projeto  da sociedade civil chamado 200 Mais, cujo objetivo é colocar 200 pessoas de diferente partidos, que façam a diferença, que tenham compromisso concreto com o combate à corrupção com a extinção ou redução do fundo eleitoral e com a preparação política. Então, essas foram as razões pelas quais eu decidi entrar no Podemos e decidi permanecer até hoje. 

SBT News – O sr. acha que a candidatura presidencial do ex-juiz Sergio Moro ficou inviabilizada? 

Deltan – O ex-juiz federal Sergio Moro é uma pessoa que acompanho e tenho acompanhado as notícias pela imprensa. Agora, cada um de nós tem uma jornada relativamente independente. Ele tem um projeto à Presidência e eu tenho um projeto de mudança no Congresso Nacional.

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