João Silva

Graduado em economia e relações internacionais pela Boston Univeristy. Mestre em relações internacionais na University of Chicago e mestre em finanças pela University of Miami.


João Victor da Silva Compartilhar
João Silva

Um desafio aos governantes: sejam eficientes!

A burocracia excessiva é uma realidade que compromete o tempo e dinheiro de milhões de cidadãos e empresas brasileiras

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Foto: Freepik
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A burocracia é um mal necessário. Afinal de contas, qualquer Estado democrático, que aplique a lei de forma igual a todos os seus cidadãos, precisa estabelecer certas regras e procedimentos de forma equânime para todos os membros de determinado segmento da sociedade. As relações entre os governantes e os cidadãos não podem ser baseadas em favores, relacionamento e atividades pouco republicanas. Entretanto, o grande paradoxo da burocracia é que quando ela começa a se expandir excessivamente, ela começa a expressar os mesmos males que originalmente se visava combater. Um aparato estatal muito grande, que obriga os cidadãos a cumprir muitas leis e procedimentos, muitas vezes inexequíveis, cria um ambiente propício a uma cultura do privilégio e da corrupção. Nesse cenário, apenas os “amigos” do aparato de Estado conseguem que suas demandas avancem pelos confusos e tortuosos processos burocráticos.

Desafortunadamente, a burocracia excessiva é uma realidade que compromete o tempo e dinheiro de milhões de cidadãos e empresas brasileiras. Todo cidadão comum e empresários que dependem do poder público para conseguir alguma licença, registro, alvará, entre tantas outras exigências governamentais, sabe que essa é uma missão, na maioria das vezes, demasiadamente complicada. Para abrir uma empresa em Florianópolis, por exemplo, é preciso realizar ao menos dez procedimentos que envolvem diferentes órgãos governamentais. Já para um alvará de construção, são ao menos 21 procedimentos. Realizar tais exigências não é um problema em si. O grande problema são os excessos da burocracia, os quais tornam diversas atividades econômicas inviáveis.

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Regulamentações excessivas e a falta de eficiência do setor público geram um custo econômico elevado para sociedade. As empresas perdem produtividade, pois precisam dedicar recursos e a atenção de seus funcionários para o cumprimento de obrigações estatais. Já o cidadão comum, perde seu tempo e dinheiro que poderiam ser alocados em pontos de maior importância de sua vida. A FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) apresentou um estudo, o qual demonstrou que a burocracia brasileira custou R$ 46,3 bilhões em 2009. Certamente, hoje este número deve ser ainda maior.

Quando consideramos que vivemos em um mundo competitivo, inclusive para o setor público, percebe-se a necessidade de os governos adotarem as melhores práticas de governança e eficiência administrativa. Afinal de contas, em um mundo globalizado e informatizado, indivíduos e empresas podem migrar para localidades com um ambiente de negócios melhor que facilite o desenvolvimento de suas vidas e empresas. O professor de economia política internacional Richard H. K. Vietor, da Universidade de Harvard, em seu livro How Countries Compete (Como os Países Competem) argumenta que uma das principais ferramentas para o desenvolvimento econômico de um país é a criação de um ambiente de negócios que atraia investimentos. Para efetivar essa estratégia de desenvolvimento de um bom ambiente de negócios o economista Gustavo Franco propõe uma estratégia em seu livro Lições Amargas. No livro, Franco menciona que o governo brasileiro deveria se guiar por rankings de instituições internacionais. Assim, o governo deveria avaliar os indicadores que o país possui as piores performances e estabelecer metas e estratégias para melhorar suas posições. Em minha visão, as propostas de Vietor e Franco não deveriam se restringir a União. Afinal de contas, os problemas dos indivíduos e empresas, em geral, não estão em Brasília, mas sim em seus estados e suas cidades.

Nesse sentido, diferentes órgãos públicos tanto de Santa Catarina quanto de Florianópolis devem se atentar ao ambiente de negócios do estado e do munícipio, respectivamente, pois manter a competividade da economia regional é crítico para o bem-estar da população. Infelizmente, de acordo com o relatório Doing Business Subnacional Brasil 2021, publicado pelo Banco Mundial em junho deste ano, Santa Catarina está na parte de baixo do ranking de facilidade de fazer negócios do Brasil. Entre as 27 unidades federativas do país, Santa Catarina está apenas na 20ª posição. Aliás, como muito dos itens analisados pelo Banco Mundial são responsabilidades das prefeituras, as capitais dos estados foram utilizadas como referência. Portanto, a má colocação de Santa Catarina também deve chamar a atenção dos gestores de Florianópolis.

Entre os cinco tópicos analisados pelo relatório, o estado se destaca positivamente em dois. Santa Catarina está na quarta colocação nos rankings de abertura de empresas e registro de propriedades. Ficamos na 13ª posição para o pagamento de impostos. No entanto, estamos na 18ª posição para obtenção de alvarás de construção e na 26ª posição em execução de contratos. Apesar de estarmos em uma boa posição nacionalmente em relação a dois dos tópicos avaliados pela pesquisa, quando comparamos Santa Catarina com outros países membros da OCDE e até mesmo do Brics, estamos ainda muito aquém do ideal.

Em Florianópolis, a obtenção de um alvará de construção leva em média 480 dias, e possui um custo de aproximadamente 1,2% do valor da construção. Quando consideramos que a média brasileira é de 323,1 dias para obtenção dos alvarás de construção e 152,7 dias nas economias de alta renda da OCDE, percebe-se que Florianópolis pode melhorar – e muito – nesse quesito. Caso tivéssemos regulações mais claras e eficientes poderíamos atrair mais investidores para o setor imobiliário da cidade, assim gerando uma maior oferta de imóveis, portanto, tornando os preços de imóveis mais acessíveis a população.

No caso da execução de contratos a situação é mais alarmante. O judiciário catarinense leva 1.316 dias (3,6 anos) para receber, julgar e executar um contrato. Ademais, o custo dos processos judiciais custa em média 28,1% do valor das ações que são julgadas. Trata-se, portanto, de uma verdadeira situação de insegurança jurídica, já que a demora para execução de contratos pode trazer danos comerciais e financeiros para indivíduos e empresas, os quais podem procurar outros estados com um judiciário mais eficiente para realizar determinados tipos de investimento. Para se ter noção, as economias de alta renda da OCDE levam 595 dias para executar um contrato, menos da metade do tempo que o judiciário catarinense leva. Em Sergipe, 1º colocado nacional, um contrato é executado em 538 dias.

Até mesmo nos tópicos que Santa Catarina está melhor posicionado nacionalmente, o estado ainda está muito longe dos indicadores dos países mais desenvolvidos. Em Florianópolis leva-se, em média, 10 dias para se abrir uma empresa, enquanto nos países de alta renda da OCDE a média é de cinco dias. Em Florianópolis leva-se 30,5 dias para registrar uma propriedade, enquanto nos países de alta renda da OCDE leva-se 23,7 dias. A questão do pagamento de impostos é ainda pior. Em Santa Catarina as empresas levam 1.501 horas (62,5 dias completos) por ano calculando impostos, já nos países de alta renda OCDE são 155,7 horas (6,5 dias completos). Pior ainda é a carga tributária em relação ao lucro. Em Santa Catarina a carga tributária total das empresas é de 65,2% dos lucros, enquanto nos países de alta renda da OCDE é de 38,8%.

Enfim, o Brasil não está por acaso em uma situação econômica ruim nos últimos anos. A estagnação econômica do Brasil é, em grande parte, resultado do péssimo ambiente de negócios que o país possui. Santa Catarina por muitos anos divergiu da média nacional. O estado já ofereceu um ambiente de estabilidade política e uma gestão governamental superior à de outros estados do país. Contudo, nos últimos anos o estado vem perdendo destaque nacionalmente e a continuidade dessa tendência pode comprometer a pujança econômica de Santa Catarina. Como demonstrado pelo estudo do Banco Mundial, o estado deve melhorar a execução de contratos, este é um desafio do Poder Judiciário catarinense. Já a grande demora para obtenção de alvarás de construção é um desafio para prefeitura de Florianópolis. Contudo, a melhora do aparato burocrático não deve se restringir a esses dois tópicos.

Santa Catarina tem um longo caminho para percorrer para se tornar um estado atrativo internacionalmente para investimentos e para garantir um melhor nível de bem-estar para sua população. Nos países mais desenvolvidos, a consolidação de uma estrutura burocrática eficiente demandou o uso abrangente de tecnologia, transparência, regras claras e incentivos a maior produtividade e integridade dos servidores públicos. Copiar esses exemplos é o caminho certo para fazer com que Florianópolis e Santa Catarina possam se desenvolver ainda mais.


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