João Silva

Graduado em economia e relações internacionais pela Boston Univeristy. Mestre em relações internacionais na University of Chicago e mestre em finanças pela University of Miami.


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João Victor da Silva

Invasão russa na Ucrânia desencadeia a maior crise político-militar das últimas décadas

A invasão do território da Ucrânia pela Rússia é um dos acontecimentos mais importantes do período pós-Guerra Fria .

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Foto: ДСНС України, Organização Não Governamental, Facebook, Reprodução
Foto: ДСНС України, Organização Não Governamental, Facebook, Reprodução

Hoje, o mundo acordou em um dos momentos de maior tensão e incertezas das últimas décadas. A invasão do território ucraniano pela Rússia é um dos acontecimentos mais importantes do período pós-Guerra Fria e as ações tomadas daqui para frente, tanto pelo Ocidente quanto pelos russos, determinarão o destino geopolítico do mundo pelos próximos anos. Diante de tal cenário, torna-se importante esclarecer quatro perguntas que devem estar na mente de todo leitor interessado sob os recentes acontecimentos na Ucrânia: Quais são os interesses da Rússia? Como a política internacional do Ocidente falhou? Como o Ocidente deve agir para evitar que novas crises geopolíticas se desenvolvam pelo mundo? Quais serão as implicações para o Brasil? 

Quais são os interesses da Rússia?

Em primeiro lugar, é importante enfatizar que os interesses russos sobre a Ucrânia possuem tanto aspectos ideológicos quanto militares. Do ponto de vista ideológico, o presidente russo, Vladimir Putin, busca implementar a restauração territorial do Império Russo. Apesar de a Rússia ser o país com maior extensão territorial do mundo, com a desintegração da União Soviética, muitos territórios do país tornaram-se independentes, entre eles a Ucrânia. Nos últimos anos, a Rússia já realizou várias operações militares com o intuito de concretizar suas aspirações expansionistas, como a Guerra na Chechênia (1999-2000), a Guerra na Ossétia do Sul (2008) e a anexação da Crimeia, uma das regiões mais estratégias da Ucrânia, localizada no Mar Negro (2014).

Do ponto de vista estratégico, a aproximação da Ucrânia com as potências ocidentais, como os Estados Unidos e a União Europeia, a partir de 2014, quando manifestações políticas no país levaram à deposição do governo pró-Rússia, colocaram a Ucrânia como uma ameaça militar ao território russo. Afinal de contas, com a possibilidade de inclusão da Ucrânia como membro da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), o poderio bélico da Ucrânia cresceria substancialmente e o estabelecimento de bases militares ocidentais na fronteira com a Rússia poderiam colocar os russos em uma condição militar vulnerável. Nesse sentido, a invasão do território ucraniano, além de atender as ambições expansionistas de Putin também teria o objetivo de minimizar a influência ocidental no leste europeu.

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Como a política internacional do Ocidente falhou?

Para um dos principais estudiosos das relações internacionais, John J. Mearsheimer, o conflito entre a Rússia e Ucrânia era apenas uma questão de tempo para ser conflagrado. Em um famoso artigo, escrito em 2014, Mearsheimer sustenta que as políticas de aproximação entre a Ucrânia e as potências ocidentais foram extremamente equivocadas. Para ele, o tripé da política ocidental – aumento do número de membros da OTAN, a expansão da União Europeia e promoção da democracia – tornou-se uma ameaça a soberania russa. Assim como a colocação de mísseis soviéticos em Cuba na década de 1960 colocou o território americano sob ameaça, quase resultando em uma guerra direta entre os Estados Unidos e União Soviética, a expansão da influência ocidental sobre a Ucrânia também poderia se tornar uma ameaça a segurança territorial russa.

Como o Ocidente deve agir para evitar que novas crises geopolíticas se desenvolvam pelo mundo?

Diante de tal cenário, parece-me que o Ocidente, especialmente os Estados Unidos, devem reavaliar a sua estratégia geopolítica. Do ponto de vista prático, a Ucrânia não é um país de interesse estratégico para o Ocidente, inclusive a política doméstica ucraniana é substancialmente conflituosa. Existe uma grande divisão entre grupos pró-Rússia e pró-Ocidente no país. Nesse sentido, os países ocidentais deveriam buscar uma solução diplomática que encerre guerra entre os dois países e estabeleça a Ucrânia como um território neutro, o qual se posicionaria como um Estado-Tampão entre o Ocidente e a Rússia. Inclusive, essa é uma solução que teve sucesso em diversos conflitos políticos e militares ao redor do mundo, em diferentes períodos. O nosso vizinho, Uruguai, é um exemplo do êxito de tal estratégia. Afinal de contas, o Uruguai, que até 1825 era um território brasileiro, foi estabelecido como um território neutro na foz do Rio da Prata, devido as crescentes tensões que existiam entre o Império do Brasil e Argentina para o controle desse rio estratégico para a economia e segurança de ambos os países. 

Contudo, uma política de neutralização política da Ucrânia não será suficiente. As recentes falhas da política internacional dos Estados Unidos colocaram a credibilidade do país em xeque. A saída desastrosa das tropas americanas do Afeganistão e a expressão de fraqueza do governo Biden fazem com que adversários dos Estados Unidos, como a Rússia e a China, avancem com suas ambições expansionistas. Caso os Estados Unidos continuem demonstrando fraqueza, o próximo passo dessas tensões geopolíticas poderá ser a invasão chinesa de Taiwan. Assim sendo, é essencial que os Estados Unidos reestabeleçam a exitosa política de “paz através da força” (em inglês, peace through strength) implementada nos governos de Ronald Reagan e Donald Trump. Apenas demonstrando uma superioridade militar avassaladora e a credibilidade de suas intenções de salvaguardar seus interesses geopolíticos, os Estados Unidos poderão conter as pretensões geopolíticas da Rússia e da China. 

Quais serão as implicações para o Brasil?

Para o Brasil, o conflito entre a Rússia e Ucrânia terá consequências econômicas que causarão grandes dilemas para diplomacia brasileira. Por um lado, já estamos experimentando a alta do preço das commodities. Tal movimento possui um efeito positivo para o agronegócio brasileiro e, portanto, para pauta exportadora do país. Todavia, o sucesso do agronegócio brasileiro depende, em grande parte, dos fertilizantes russos e da compra de nossos produtos pela China. Ou seja, economicamente o Brasil está dependente dos dois países que ameaçam a hegemonia política Ocidental. Por outro lado, apesar do aumento do preço das commodities favorecer, de forma geral, a economia brasileira, o aumento do preço do gás natural e do petróleo devem colocar maior pressão inflacionária no país, especialmente através do aumento dos preços dos combustíveis e da energia. Em última instância, a diplomacia brasileira terá um grande desafio de balançar a aproximação político-militar do Brasil com as potências ocidentais enquanto mantêm as relações econômicas com a Rússia e a China.

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